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Terminaremos a semana falando sobre alianças. Sim, alianças. Necessitamos disso. Nas palavras de um livro recente sobre o tema, “as alianças não são o tema central das Escrituras. Em vez disso, as alianças formam a espinha dorsal da meta-narrativa da Bíblia e, portanto, é essencial “reuni-las” corretamente para discernir com precisão todo o conselho de Deus “. Essas palavras são de Peter Gentry e Stephen Wellum (ver Kingdom, 21, God’s Kingdom, 17).

As alianças são uma espécie de estrutura óssea, e devemos constitui-las corretamente. Para explicar alianças e como funcionam, liguei para o Dr. Don Carson. Algumas sexta-feiras, eu ligo para ele, como parte do nosso relacionamento com nossos amigos da Coalizão pelo Evangelho. Carson é o co-fundador e presidente da Coalizão pelo Evangelho, e também o editor da NIV Zondervan Study Bible, a qual é a versão de Bíblia de estudo que estamos utilizando nestes podcasts ocasionais de sexta-feira.

Portanto, o que é uma aliança e como elas estruturam nossas Bíblias? Aqui está Don Carson para esclarecer:

Os cristãos sabem, é claro, que a Bíblia é composta de dois testamentos e eles podem se perguntar de tempos em tempos, de onde vem a palavra testamento. Ela vem de duas passagens no Novo Testamento, uma em Hebreus e uma em Gálatas, onde a palavra é traduzida corretamente como aliança. Seria mais fácil, seria mais preciso falar da Bíblia como tendo duas alianças: a antiga aliança e a nova aliança. É claro que herdamos o termo testamento, então continuaremos a falar da Bíblia como tendo dois testamentos, mas a noção de aliança molda uma grande quantidade de como a Bíblia é organizada, muito mais do que a palavra testamento.

Novamente, devemos começar em Gênesis 1-3 no jardim do Éden. A palavra aliança não é utilizada neste texto. Mas uma das coisas impressionantes sobre Gênesis 1-3, do que já vimos algo anteriormente, é que estes capítulos representam uma espécie de incubadora de noções que são desenvolvidas em detalhes muito mais ricos mais adiante na Bíblia. A Bíblia não fala de Deus como Rei nesses capítulos. Mas claramente, ele está reinando. A Bíblia não fala sobre a igreja nesses capítulos, mas há o início de seus próprios eleitos, o povo da aliança. A Bíblia realmente não fala sobre sacrifício de sangue nestes capítulos, mas, no entanto, a vestimenta que Deus providencia para Adão e Eva requereu a morte de um animal. A Bíblia não fala sobre a Trindade, mas existem expressões estranhas tal como “Façamos o homem à nossa imagem” (Gênesis 1.26).

E da mesma forma, a Bíblia certamente não fala de aliança ali. No entanto, há, de certa forma, o que alguns teólogos denominaram de “aliança das obras”. Provavelmente, a melhor defesa da noção de que a aliança é introduzida nestes capítulos é o livro de Michael Horton chamado “Covenant and Eschatology” [Alianças e Escatologia]. Em qualquer caso, há um acordo feito por um soberano (neste caso, Deus) com seres humanos onde há adoração e louvor de um lado, e benção, proteção e privilégio concedidos por Deus do outro lado; sob condição de obediência absoluta, com a ameaça de julgamento garantido se houver desobediência. Esta é a configuração do horrível drama de Gênesis 3, onde os seres humanos escolhem a rebeldia e a desobediência e morrem; morrem de formas múltiplas.

No entanto, presumo que a primeira aliança em que as pessoas prestam muita atenção é a aliança abraâmica. Mas antes de chegar lá, há a aliança de Noé, a aliança com Noé após Deus destruir o mundo através das águas, com apenas oito seres humanos sobrevivendo para repovoar a Terra novamente. Pela graça, Deus prometeu não destruir o mundo novamente pelas águas. A próxima destruição do mundo será por fogo no final dos tempos. Esta é uma teologia que se reflete em 2 Pedro.

Mas neste caso, Deus faz uma aliança que é selada por um sinal público; isto é, o arco-íris. O arco-íris assume um significado de aliança. A aliança abraâmica é muito mais complicada. Às vezes é chamada de “aliança da promessa”. Ela é descrita em vários capítulos. Em primeiro lugar, Gênesis 12: “Ora, disse o SENHOR a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra que te mostrarei; de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção! Abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão benditas todas as famílias da terra.” A palavra aliança não é usada neste texto, mas há uma benção total de Deus com promessas não somente para Abraão, mas através de Abraão para todos os povos da terra que serão abençoados através dele. Isto está no capítulo 12.

Gênesis 15.1-2 tem uma cena dramática. Deus estabelece Sua aliança com Abrão. Nós lemos: “Depois destes acontecimentos, veio a palavra do SENHOR a Abrão, numa visão, e disse: Não temas, Abrão, eu sou o teu escudo, e teu galardão será sobremodo grande.” E então, há muita conversa sobre a promessa de Deus de que ele irá fornecer um filho e um herdeiro e uma herança (versículos 2-4). E nos diz no versículo seis: “Ele [Abrão] creu no SENHOR, e isso lhe foi imputado para justiça.”

Então ao final do capítulo, há uma cena dramática, que a primeira parte do capítulo introduz (Gênesis 15.12-21). Nesta cena em uma visão assim que o sol está se pondo, Abrão cai em sono profundo e uma escuridão espessa e terrível vem sobre ele. E o Senhor promete algumas coisas que acontecerão no futuro. E quando o sol se põe completamente e há densas trevas, há um fogareiro fumegante com uma tocha de fogo que aparecem e passam entre os animais que haviam sido partidos ao meio, e o simbolismo advém de maldições utilizadas naquela época. Às vezes, um estado soberano, uma superpotência regional fazia uma aliança com um estado vassalo. Na verdade, seria uma aliança imposta, mas seria posicionada com uma espécie de preâmbulo histórico. Seria posicionada como uma promessa mútua. O soberano regional promete proteção e segurança, benção e prosperidade, e o estado vassalo promete obediência, pagar impostos quando devidos, não se rebelar e esse tipo de coisa.

E então há uma maldição mútua. “Que isto e mais seja feito a mim, se eu romper esta aliança” (veja Gênesis 15.17). O que significa, de fato, é que a maldição cai sobre o membro inferior, sobre o estado vassalo. Em outras palavras, se o estado vassalo se revoltar e tentar fazer uma ligação política com algum outro poder regional, haverá um julgamento terrível que virá. E no simbolismo dos animais cortados, as duas partes devem caminhar entre os animais cortados e, implicitamente, estão dizendo: “Que isto seja feito a mim. Que o meu corpo seja cortado e destruído se eu romper esta aliança “. Mas nesta visão do sono de Abrão, apenas o pote de fogo, que representa Deus, passa entre os dois animais, como se o próprio Deus assumisse toda a maldição sozinho. Isto está no capítulo 15.

Em Gênesis 17, a aliança é selada pelo sinal da circuncisão. E então, há Gênesis 22 e a prova de Abraão, o quase sacrifício do filho de Abraão depois que Deus impede que Abraão mate o menino. A voz do céu, o anjo do Senhor fala: “Não estendas a mão sobre o rapaz … pois agora sei que temes a Deus” (versículo 12). E Abraão eventualmente chama aquele lugar de “O SENHOR Proverá. Daí dizer-se até ao dia de hoje: No monte do SENHOR se proverá.” (versículo 14).

E então, pela segunda vez, o anjo do Senhor chama a Abraão do céu. E através dele, Deus jura: “Jurei, por mim mesmo, diz o SENHOR, porquanto fizeste isso e não me negaste o teu único filho, que deveras te abençoarei e certamente multiplicarei a tua descendência como as estrelas dos céus e como a areia na praia do mar; a tua descendência possuirá a cidade dos seus inimigos, nela serão benditas todas as nações da terra, porquanto obedeceste à minha voz.” (Gênesis 22.16-18) Esta é a mesma benção e a promessa que vem desde os capítulos 12, 15 e 17.

Agora, é possível configurar estes capítulos de maneira um pouco diferente. Por exemplo, há um excelente estudioso australiano chamado Paul Williamson, cujo livro “Sealed with an Oath: Covenant in God’s Unfolding Purpose” [Selado com um Juramento: a Aliança no Desdobramento dos Propósitos de Deus]” vê duas alianças aqui, em vez de apenas uma. Mas o detalhe não é tão importante quanto ver como esta aliança abraâmica (ou estas alianças abraâmicas, se assim preferirmos), são cumpridas no Novo Testamento. Esta promessa de que, através da semente de Abrão, todas as nações da terra serão abençoadas é realçada numa exibição espetacular, especialmente em Gálatas 3. E o cumprimento da promessa se encontra na semente final, o próprio Jesus Cristo que traz bênção a todos os povos da terra tal como prometido. Portanto, esta é a aliança abraâmica.

Mais tarde, uma aliança é feita com o povo de Deus como nação em Êxodo, e esta é a que às vezes é referida no Novo Testamento como a antiga aliança. É a aliança que predomina na existência cotidiana dos israelitas durante grande parte da sua existência nacional. Após Deus retirar o povo da terra da escravidão, este é o pressuposto da aliança. Deus primeiro salva o povo e depois entra em uma aliança com eles, onde se lê: “No terceiro mês da saída dos filhos de Israel da terra do Egito, no primeiro dia desse mês, vieram ao deserto do Sinai.” (Êxodo 19.1). E Moisés subiu ao monte de Deus, e Deus o chama e diz:

“Assim falarás à casa de Jacó e anunciarás aos filhos de Israel: Tendes visto o que fiz aos egípcios, como vos levei sobre asas de águia e vos cheguei a mim. Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, então, sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos; porque toda a terra é minha; vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa. São estas as palavras que falarás aos filhos de Israel.” (Êxodo 19.3-6)

E a mesma ordem das coisas é encontrada no próximo capítulo, os Dez Mandamentos, o ponto alto da estrutura dessa aliança. Mas novamente, o pressuposto é que ele é imposto por Deus, que trouxe o povo da terra do Egito. Então, falou Deus todas estas palavras: Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão.” (Êxodo 20.1-2). E então começa, “Não terás outros deuses diante de mim.” e assim por diante (Êxodo 20.3).

Os capítulos 21-23 são o chamado código de santidade. E então chegamos a Êxodo 24, e a aliança é confirmada. Muito do Antigo Testamento está ligado à importância da aliança do Sinai como às vezes é chamado, ou a antiga aliança ou a aliança mosaica porque Moisés foi seu mediador. E o que é muito claro sobre essa aliança é que ela é profundamente condicionada pela obediência. “Sereis meu povo se me obedecerdes”.

E então, há o livro de Deuteronômio onde o livro está estruturado como uma série de falas de Moisés ao povo antes de morrer, e eles estão no limite de entrar na Terra Prometida. A estrutura, a linguagem do livro é uma espécie de renovação das alianças. É o estabelecimento, mais uma vez, da aliança mosaica. Em muitos, muitos aspectos, este é o livro da aliança. E tudo isto está antes mesmo de sairmos do Pentateuco.

Então, uma aliança adicional é estabelecida com Davi e a inauguração da dinastia davídica. Voltaremos a isto em uma sessão posterior. Mas isso também é importante, com promessas que são dadas a Davi sobre o Filho maior do grande Davi: Deus assegurará que haverá um descendente, um herdeiro da linha de Davi, que se sentará no trono, e, finalmente, será chamado de Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz;. Isso está em Isaías 9.6, é claro; palavras que cantamos a cada Natal, na música gloriosa do Messias de Handel. Mas a base desta promessa se encontra em 2 Samuel 7.

Então, passaremos adiante para a promessa da nova aliança. Esta aparece em vários textos do Antigo Testamento, entre outras, Jeremias 31 e também em Ezequiel 36 e em outros lugares, de modo que, séculos antes de Cristo, Deus havia prometido que a antiga aliança, isto é, a aliança com Moisés, não duraria para sempre. Na verdade, o escritor de Hebreus explica este argumento em Hebreus 8 muito poderosamente, após citar Jeremias 31: Depois daqueles dias, firmarei uma nova aliança. Não segundo a velha aliança. Será uma nova aliança (ver Hebreus 8.8-12). E então ele explica os detalhes pelos quais será caracterizada como nova. Então o escritor diz em Hebreus 8.13: “Quando ele diz Nova, torna antiquada a primeira”. Ele estava prometendo uma nova aliança. E isso ocorreu seis séculos antes da vinda de Cristo, quando é feita a promessa de uma nova aliança.

É claro que isto levanta vários tipos de perguntas sobre como a antiga aliança se relacionará com a nova aliança. Quais coisas continuarão? Quais coisas não continuarão? Por exemplo, de acordo com Jesus no Evangelho de Marcos, Jesus considerou puros todos os alimentos (Marcos 7.19). Isto contradiz as estipulações da antiga aliança. Retornaremos a estes pontos mais tarde nesta série. Mas entre a antiga aliança e a nova aliança, há pontos de continuidade e pontos de descontinuidade.

Portanto, agora com essa multiplicidade de alianças, começamos a ver como, de diferentes maneiras, elas apontam para a nova aliança com Jesus. A aliança abraâmica aponta para a nova aliança, prometendo uma semente que traria bençãos a toda a terra e fazendo de Abraão uma figura protótipo de fé. Ele se torna o pai dos que compartilham sua fé salvadora. Esse argumento é elaborado, por exemplo, em Romanos 4. E a antiga aliança estabelece vários tipos de estruturas do que é certo e o que é errado, bem como as bênçãos e as maldições e a importância da obediência, mas não tem poder intrínseco para transformar. Essa não é a forma como a antiga aliança (a aliança mosaica) está estruturada.

Mas, por outro lado, ela estabelece muitos precedentes e estruturas. Por exemplo, é sob os termos da antiga aliança que a chamada arca da aliança, torna-se realmente importante, na qual o sangue de touros e cabras é aspergido. E este é o lugar do tabernáculo, o lugar de encontro entre Deus e os seres humanos. É a organização do povo de Deus em um estado-nação, um povo da aliança, um reino dos sacerdotes. E todas essas coisas se tornam estruturas que apontam e antecipam o povo da aliança de Deus, quando Jesus diz: Edificarei minha assembléia. “Edificarei minha igreja” (Mateus 16.18). Ele vem como o criador da aliança messiânica.

Pois bem, há algumas pessoas que olham as promessas da nova aliança em Jeremias 31 e em textos paralelos e dizem que o que é prometido é apenas a renovação da aliança. E eu diria que eles estão parcialmente corretos. Ou seja, existem alguns elementos da aliança que estão sendo renovados, mas, no entanto, a linguagem de Jeremias 31 é muito explícita. Não será como a antiga aliança em certos detalhes, que na verdade, não temos tempo para detalhar. E esta é a linguagem a qual Hebreus 8 se refere de forma muito explícita. É a promessa de uma nova aliança que torna a antiga obsoleta e prestes a desaparecer. Se a promessa fosse apenas de uma aliança renovada, então seria impróprio inferir que a antiga está se tornou obsoleta e prestes a desaparecer (ver Hebreus 8.13).

E então, é claro, quando chegamos à narrativa da paixão na Última Ceia, Jesus tomou o cálice e disse: “Este cálice é a nova aliança no meu sangue” (1 Coríntios 11.25). E Hebreus 10 explica isto em detalhes, para deixar claro que Jesus é o Mediador de uma nova aliança e que ele está adentrando um tabernáculo melhor: seu sacrifício é completo e de uma vez por todas e não necessita ser repetido a cada ano. E, como Mediador desta nova aliança, ele é capaz de salvar totalmente todos os que vierem a Deus através ele, precisamente porque seu sacrifício foi de uma vez por todas e não necessita ser repetido e seu sangue é totalmente suficiente a este respeito (Hebreus 7.23-28).

Agora, existem muitas outras coisas que poderiam ser ditas ao longo dessas mesmas linhas. O Evangelho de João não utiliza a palavra aliança, por exemplo. Mas está repleto de temas sobre a aliança. Há uma promessa de território, conectada na aliança do Antigo Testamento à Abraão. Cristãos discordam de como exatamente estas promessas de aliança são cumpridas. Mas um dos livros recentes na série “New Studies in Biblical Theology” [Novos Estudos em Teologia Bíblica], o livro de Oren Martin, “Bound for the Promised Land” [A Caminho da Terra Prometida], argumenta muito fortemente que a suprema realização destas promessas é um novo céu e uma nova terra. É mais do que somente o território de Israel, e não menos.

Da mesma forma, existem algumas diferenças entre os cristãos quanto à forma de que a nova aliança cumpre a antiga, mas não há necessidade que nos detenhamos em tais debates. O que é importante para os nossos propósitos é que este drama de alianças que se desdobram (e eu não as incluí todas aqui), esse drama das alianças que se desdobram, finalmente nos leva à renovação da aliança na mesa do Senhor e ao selo de aliança no batismo, que é reconhecida tanto por batistas quanto por pedobatistas. Estes o interpretam duma maneira um pouco diferente, mas, no entanto, há o selo de aliança no batismo, que demarca o povo de Deus.

Portanto, devemos nos ver agora como pessoas da nova aliança, em continuidade com a aliança de graça pronunciada para Abraão, em cumprimento da aliança de lei que foi elaborada com Moisés e no Sinai, com realizações tipológicas e realizações explícitas agora no fim dos tempos, na plenitude dos tempos, até que possamos finalmente pousar no novo céu e na nova terra, o lar da justiça, o objetivo de todas as promessas de aliança.

Traduzido por: Suzana L. Braga.

Originalmente publicado em DesiringGod.org.

 

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