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Quem não ama uma boa frase em latim, especialmente quando pode ser divulgada para apoiar o espírito da época?

Semper Reformanda. Sempre Reformando.

Quando a igreja muda de ideia (ou quando um professor ou pastor ou um blogueiro profissional exige que a igreja mude sua mente) sobre, por exemplo, a definição de casamento ou a natureza do pecado sexual, podemos ter certeza de que, por mais que alguns tradicionalistas possam se opor à mudança, a igreja está corajosamente incorporando o legado dos Reformadores e sua insistência de que a igreja deveria sempre estar se reformando. O Espírito revela novas verdades para uma nova época. O corpo de Cristo aprende a deixar de lado a ortodoxia incrustada. O Jesus ressuscitado ensina a seu povo o que eles nunca tinham visto antes. Isto é o que tem tudo a ver com “semper reformanda”, certo?

Não exatamente.

Embora seja verdade que todos nós vemos “como por espelho, em enigma” e devemos estar abertos para mudar nossas mentes, a frase latina “semper reformanda” não se referia a mudanças pelo prazer de mudar, e muito menos, reformar as confissões da igreja para acompanhar os tempos. Em um capítulo perspicaz intitulado “Reformed and Always Reforming” [Reformado e Sempre Reformando] no livro “Always Reformed” [Sempre Reformado]: Ensaios em Honra de W. Robert Godfrey, páginas 116 a 134), Mike Horton explica as origens da frase famosa. A frase apareceu em 1674 num livro devocional de Jodocus van Lodenstein. Como figura-chave na Segunda Reforma Holandesa (Nadere Reformatie), van Lodenstein queria ver os membros da igreja holandesa, cuja doutrina se tornou Reformada durante a Reforma, continuar a buscar uma reforma em suas vidas e práticas. Sua preocupação era a piedade pessoal, não o progressivíssimo doutrinário.

É importante ver a totalidade da frase de van Lodenstein: “ecclesia reformata, semper reformanda secundum verbi Dei” (“a igreja está Reformada e está sempre na necessidade de ser reformada de acordo com a Palavra de Deus”). Observe três coisas sobre a frase.

Primeiro, começa por abordar a igreja que é Reformada. Dado o contexto de van Lodenstein nos Países Baixos, temos razão em colocar a letra inicial maiúscula em Reformada. O ditado não se referia genericamente às igrejas da Reforma (embora tenha aplicação para estas igrejas também). Ao invés disso, van Lodenstein estava dirigindo-se à igreja holandesa que havia se identificado como confessionalmente reformada, especificamente por ter assinado os Símbolos de Fé das Igrejas Reformadas (Confissão Belga, Catecismo de Heidelberg e Cânones de Dort). Em outras palavras, longe de encorajar a inovação doutrinária, a frase original pressupõe a estabilidade doutrinária. Qualquer que seja o significado de “semper reformanda”, não pode significar uma descoberta de padrões teológicos de imediato, durante o percurso.

Em segundo lugar, o verbo latino “reformanda” é passivo, o que, como Horton ressalta, significa que a igreja não está “sempre reformando”, mas está “sempre sendo reformada”. A diferença tem importância. A anterior soa como mudança pelo prazer de mudar, enquanto última sugere adesão ao padrão apropriado. A construção passiva também sugere que há um agente externo que opera sobre a igreja para fazer a reforma necessária.

O que nos leva ao terceiro e mais importante ponto: a igreja sempre está sendo reformada de acordo com a Palavra de Deus. Não há nada Reformado ou Reformador sobre mudar a teologia e a ética da igreja para entrar no “lado correto da história”, ou para nos mantermos atualizados com os insights das ciências sociais, ou mesmo para provar que amamos “os mais pequeninos”. O lema da Reforma não era “Avançar!”, mas “Retornar!”, como “Retornar às Fontes!” (“ad fontes”) . Como escreveu Horton, os reformadores “queriam recuperar algo perdido, não seguir os ventos de uma modernidade crescente” (página 123). Se a igreja não pode nunca ficar parada, é porque sempre necessita se reorientar de acordo com a Palavra que está sobre nós (página 125).

“Semper reformanda” não se trata de flutuações constantes, mas de alicerces robustos. Trata-se de uma adesão radical às Sagradas Escrituras, não importa o custo para nós mesmos, nossas tradições ou o nosso próprio sentimento falível de relevância cultural. Se os cristãos querem mudar a ética sexual da igreja, que assim seja. Mas não reivindiquem o manto dos Reformadores ao fazê-lo. A única Reforma que vale a pena promover e pela qual vale a pena orar é aquela que nos aprofunda em nossas Bíblias, não a que nos distancia.

Mantenha-se firme, persevere, guarde o bom depósito. E esteja aberto às mudanças, sempre que estejamos derivados da verdade ou deixemos de crescer nela como deveríamos.

Traduzido por Raul Flores

 

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