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Penso que a lógica e a argumentação podem sugerir a existência de Deus. Eu mesmo fui beneficiado por apologistas tal como William Lane Craig, que faz isto muito bem.

Claro que essa não é a única maneira de sugerir a existência de Deus. É possível fazer com que Deus seja plausível não como a conclusão de uma linha de raciocínio, mas como a premissa da experiência humana. Essa abordagem diz, de fato, “se Deus não existe, muito da vida — muito do que simplesmente temos por certo à cada dia, no jeito como somos e agimos — se torna misterioso e inexplicável”.

Tal estratégia muitas vezes é racionalmente evitável, mas isto não significa que ela seja menos eficaz na vida real. Na realidade, em nosso cenário cultural, muitas das pessoas solitárias e famintas por transcendência, silenciosamente desesperadas ao nosso redor, podem se identificar mais com considerações estéticas e existenciais do que com argumentos lógicos. Muitas vezes a beleza do evangelho é a apologética mais poderosa. É por esta razão que repetidamente retorno à ficção de C. S. Lewis. Ela nos fala poderosamente à imaginação.

Aqui estão três aspectos da vida e da sociedade humanas que ficam um pouco fora de lugar — com saudades de casa, poderíamos dizer — quando confinadas aos limites de uma cosmovisão naturalista. Não são prova da existência de Deus, mas são meio estranhos sem Ele.

1. Os Pensamentos

Se nosso cérebro for simplesmente um epifenômeno, o subproduto de um processo evolucionário naturalista, então o pensar é uma coisa esquisita. Na visão naturalista, nossos cérebros funcionam desse jeito por causa do efeito selecionador de uma quantidade inimaginável de eras de seleção natural. Perpetuar os nossos genes foi o que determinou tudo. Portanto, podemos confiar em nosso uso da razão — ou mesmo em algum conhecimento nosso? De forma mais básica, o que é o pensar exatamente? Como é ele gerado a partir de processos estritamente físicos?

Não é necessário ser religioso para entender a complexidade desta questão. Este é um desafio perene da filosofia. Considere a questão de consciência, por exemplo. Thomas Nagel, que por acaso é um cético em relação à existência de Deus, pensa que a consciência humana não é redutível a um processo estritamente material. Em sua excelente introdução à filosofia, ele admite:

“Eu mesmo, creio que este aspecto interno da dor e de outras experiências conscientes não pode ser adequadamente analisado em termos de qualquer sistema de relações causais de estímulos físicos, por mais complexos que sejam. Me parece que existem dois tipos muito diferentes de coisas acontecendo no mundo: as coisas que pertencem à realidade física, que múltiplas pessoas diferentes podem observar de fora, e outras coisas que pertencem à realidade mental, que cada um de nós vivencia interiormente em si mesmo”.

Toda essa ideia de uma “realidade mental” distinta da física é curiosa. Por que razão o mundo físico geraria esta esfera separada da mente?

Tomemos a matemática como exemplo. Temos a tendência de pensar na matemática como sendo um fenômeno estritamente lógico e autoexplicativo. Mas quando refletimos sobre ela, a matemática é extremamente misteriosa. Por que razão 2 + 3 = 5 deveria ser verdade sempre e em todo lugar? O mundo físico é interdependente e relativo — até o tempo e o espaço estão interligados, tal como demonstrou Einstein. No entanto, o mundo dos números é fixo, universal e obrigatório. Portanto, de onde veio isto?

Eis uma maneira de tentar entender o problema: se todo o universo entrasse em colapso, culminando na não-existência, ainda assim seria verdade que 2 + 3 = 5? A maioria das pessoas diria que sim, mas se o universo é tudo o que existe, o que daria estabilidade a estes números? Por que razão a esfera mental teria permanência se a esfera material está em fluxo? O que é este mundo intelectual que se ergue ao nosso redor, como um castelo invisível — e como apareceu?

Sem Deus, o pensar parece ser uma coisa fora de lugar.

2. Escolhas

As escolhas são outra coisa esquisita no naturalismo. Se o universo é um sistema fechado de causa e efeito, então tudo o que acontece tem uma causa material anterior — tal como uma bola de bilhar batendo noutra.

Sendo assim, se somos entidades estritamente materiais (embora altamente complexas), de onde teria vindo a liberdade de escolha? Fazemos escolhas com nossos cérebros, e nossos cérebros são objetos físicos, ao lado de toda a panóplia de outros objetos físicos no universo, de estrelas a esponjas e chucrute. O que tornaria as nossas escolhas em algo diferente do resultado de uma série extremamente complicada de eventos materiais anteriores, como trilhões de bolas de bilhar batendo umas nas outras?

De fato, à medida em que melhor entendemos a neurociência, mais vemos como a nossa vida mental está correlacionada com a parte física de nossos cérebros. Considere o caso de Phineas Gage, que trabalhava na construção de ferrovias no século XIX. Ele sofreu um acidente infeliz no qual uma grande barra de ferro atravessou completamente sua cabeça, entrando pelo lobo frontal esquerdo, mas sobreviveu e se recuperou lentamente. Infelizmente, sua personalidade mudou completamente após o acidente. Basicamente, ele se tornou alguém não muito agradável. Muitos outros casos como este foram documentados, nas quais o cérebro fisicamente exerce uma enorme influência sobre a totalidade da nossa vida mental. Isto levanta a questão: é possível reduzir a mente completamente à matéria? Se este for o caso, seria nossa consciência de tomar decisões responsáveis uma ilusão? A liberdade de escolha é possível?

De forma ainda mais preocupante, e quanto às nossas decisões morais? Se o reducionismo físico é tudo o que há, em que sentido nossas ações podem ser objetivamente boas ou más?

Sem Deus, as escolhas parecem ser uma coisa fora do lugar.

3. A Esperança

A esperança é essencial para a vida humana. Como afirmou Viktor Frankl, um sobrevivente do holocausto: “Quem tem um porquê enfrenta qualquer como”. E tragicamente, o oposto também é verdadeiro; é impossível viver sem esperança. As manchetes recentes infelizmente nos lembram do que fazemos quando ficamos sem esperança.

O poder da esperança foi dramatizado de forma comovente no filme A Redençāo de Shawshank, em particular no seu retrato da luta de Andy Dufresne para encontrar esperança em uma situação aparentemente sem nenhuma esperança. É a esperança que determina se a vida vale a pena ser vivida: é ou “se ocupe em viver”, ou “se ocupe em morrer”.

Ele escolhe viver, e no contexto desta escolha, ele diz: “A esperança é uma coisa boa, talvez a melhor coisa; e nenhuma coisa boa morre”.

Mas será que um naturalista pode concordar com Andy Dufresne? Não vejo como isto seria possível. Em uma filosofia naturalista, a esperança morre. Basta esperar um tempo suficiente e não haverá ninguém para ter esperança. De fato, não é somente o fato de que cada indivíduo vai morrer, mas todo o universo vai acabar morrendo por calor, e portanto, cada conquista de cada pessoa será tragada e esquecida para sempre.

Por que odiamos e temos tanto medo desta perspectiva de que tudo está decaindo? Por que isto nos parece tão antinatural? A tristeza na morte é compreensível com base no naturalismo. No entanto, a intensidade do nosso medo da morte é curiosa. Por que ansiamos por um significado último, pela felicidade permanente, pela ligação com algo transcendente?

É muito curioso que um mundo, em última análise desprovido de esperança, produza criaturas que não podem viver sem ela.

De fato, sem Deus, a esperança parece uma coisa fora de lugar.

Alguém Sussurrando

C. S. Lewis escreveu a frase famosa: “Deus sussurra em nossos prazeres, fala em nossas consciências, mas grita em nossas dores”. Em outras palavras, nem todas as falas de Deus estão no mesmo volume, A clareza e a força da revelação divina variam.

A meu ver, as pistas sobre Deus na nossa vida mental, emocional e de escolhas estão na categoria do “sussurro”. Estes não são os lugares mais óbvios ou inegáveis para encontrar a Deus. (Para estes, eu me volto ao Big Bang, à ressurreição de Jesus, às vidas dos santos piedosos e ao meu profundo e inegável senso de Deus em meu coração e na minha consciência.)

No entanto, o fato de que o nosso mundo produz criaturas que tem pensamentos, escolhas e esperança, dentro de um quadro naturalista, é um curso de eventos no mínimo curioso. Se escutarmos com atenção poderemos ouvir Alguém sussurrando.

Traduzido por David Bello.

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