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O Coalizão pelo Evangelho pleiteia as pregações expositivas e cristocêntricas. A Coalizão pelo Evangelho também crê que os líderes devem abordar as questões atuais. Tal compromisso é evidenciado em seus artigos sobre temas prementes, tais como o sexo e questões raciais, bem como as artes, cultura e trabalho.

Historicamente, no entanto, alguns identificaram uma tensão entre a pregação cristocêntrica e um interesse em necessidades prementes. Receiam que a preocupação com as questões atuais irá comprometer a exposição autêntica. De forma exagerada, o que um chama de dedicação às questões atuais, outro chama de ceder às necessidades prementes. Pode um ministério de pregação ser cristocêntrico e ao mesmo tempo sensível às necessidades prementes?

Pregação Sensível às Necessidades

A pregação sensível às necessidades é um imperativo. A Bíblia é a Palavra de Deus à humanidade, e nós somos necessitados — pecadores, alienados e moribundos. Se um pregador não consegue mostrar como Deus trata e resolve nossas necessidades, ele fez uma palestra e não um sermão. Além disso, como Moisés Silva observa, estarmos conscientes de nossas necessidades nos torna melhores exegetas. Portanto, é “adequado e até mesmo necessário abordar a Bíblia com um forte sentido das nossas necessidades.” Nossos problemas “muitas vezes nos alertam para verdades nas Escrituras que, de outra forma, poderiam permanecer veladas para nós. Uma exegese adequada consiste principalmente em fazer as perguntas certas a partir do texto.”

Assim, enquanto a pregação orientada às necessidades concentra-se nas (ou possivelmente cede às) necessidades aparentes, a pregação sensível às necessidades centra-se na Palavra de Deus, mas o faz com um olho voltado às nossas necessidades. Pregadores sensíveis às necessidades visam a atender às necessidades reais e a avaliar se as necessidades aparentes são genuínas.

Jesus Redefiniu as Necessidades Aparentes

A defesa do ministério sensível às necessidades começa com Jesus. Quando cegos ou leprosos vieram ter com ele, e quando amigos trouxeram aleijados e endemoninhados, Jesus respondeu às suas necessidades. Às vezes, ele deu às pessoas exatamente o que eles queriam. Em Mateus 20.29-34, Jesus passou ao lado de dois homens cegos. Ouvindo que ele estava próximo, eles clamaram: “Senhor, Filho de Davi, tem compaixão de nós.” Movido por compaixão, Jesus deu-lhes exatamente o que eles queriam. Ele tocou os seus olhos, eles viram, e o seguiram.

Jesus também redefiniu as necessidades aparentes. Um homem achava que precisava de uma melhor divisão de sua herança; Jesus sabia que ele precisava de uma advertência sobre a ganância (Lucas 12.13-21). Um jovem rico acreditava que precisava trabalhar para conseguir a vida eterna; Jesus o reapresentou ao primeiro mandamento (Mt. 19.16-22). Jesus recusou totalmente algumas petições, inclusive pedidos por sinais miraculosos (Mt. 12.38; 16.1). Os apóstolos também satisfaziam algumas necessidades enquanto ajustavam ou recusavam outras (Atos 5.15-16, 3.3, 8.18-23).

A pregação sensível às necessidades é um imperativo. A Escritura se dirige a nós acima de tudo — e nós somos necessitados. A igreja é um hospital. É também uma sociedade de resgate que procura o perdido e acolhe o encontrado. Pregadores sensíveis às necessidades sabem que a jornada para a fé pode começar com desejos egoístas.

Considere o filho pródigo (mais jovem) de Lucas 15. Ele precisava de comida, e por isso resolveu ir para casa e dizer: “Pai, pequei conta o céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho. trata-me como um dos teus empregados.” Vemos interesse próprio ( “Estou perecendo de forme), arrependimento genuíno (“pequei contra o céu”), e confusão ( “Trate-me como um empregado”). O arrependimento do filho pródigo começou com uma sensação de necessidade. No entanto, ele achava que o que ele precisava era de um emprego, quando na verdade precisava da graça amorosa.

Corrigindo as Necessidades Sentidas

Pregadores podem seguir a Jesus no que diz respeito ao tratamento e correção das necessidades sentidas. Novamente, é necessário distinguir a pregação sensível às necessidades da pregação orientada às necessidades. Esta última foca nos ouvintes e em seus problemas aparentes. Embora este tipo de pregação orientada às necessidades possa ter um apelo especial àqueles que não frequentam uma igreja, ela também se dirige aos discípulos, gerando sermões sobre temas como conflitos, sexo, trabalho, dinheiro, questões raciais, amizade, política e identidade.

Os críticos acusam a pregação orientada às necessidade de satisfazer a uma mentalidade consumista. Dizem que ela distorce o evangelho centrado em Cristo, numa falsificação centrada no homem: nós já não mais existimos para servir a Deus; Deus existe para nos servir. Além disso, dizem os críticos, seres humanos caídos interpretam mal suas necessidades. Se pregadores não questionam as necessidades sentidas, eles se direcionarão a satisfazer o tênue desejo por mais prazer ou menos dor. As pessoas pressupõem que precisam de conselhos sobre o que fazer, quando na realidade precisam ouvir que necessitam mudar, ou nunca serão capazes de fazer a coisa certa. Creem que necessitam de respostas para as suas perguntas, quando na verdade necessitam de novas perguntas. Suas perguntas demonstram que puseram as suas mentes nas “coisas do homem”, não nas “coisas de Deus” (Mt. 16.23)

Conectando as Necessidades Sentidas às Necessidades Reais

Pastores fiéis conectarão os desejos — necessidades sentidas — às necessidades reais. Por exemplo, o desejo de ser rico se conecta ao desejo legítimo pelas necessidades da vida. O desejo pelo domínio exagera o desejo legítimo por influência. A fome de prestígio é uma versão idólatra da necessidade de pertencer. Até mesmo o desejo por justificar-se, distorce o desejo de estar bem com Deus, como destacam Douglas Schuurman e Cornelius Plantinga. Assim podemos conectar necessidades aparentes às necessidades reais, inclusive as necessidades soteriológicas. A justificação cura a culpa, a adoção atende à necessidade de amor e de comunidade, e a santificação nos liberta das garras do pecado. As necessidades sentidas e as necessidades reais de fato se conectam.

O perigo central na pregação orientada às necessidades é o antropocentrismo. Na pior das hipóteses, o culto deixa de ser uma reunião buscando agradar a Deus e passa a ser um local de entretenimento projetado para nos agradar. Este método pode restringir a pregação até que a congregação ouça não todo o conselho de Deus, mas toda a ladainha de queixas humana, como Dennis Johnson observa. No pior caso, a pregação orientada às necessidades abdica da liderança pastoral, ameaçando obscurecer a austeridade das demandas divinas e negligenciar a salvação da qual mais necessitamos.

Fazendo Exegese do Texto e da Audiência

A pregação sensível às necessidades pode evitar estes perigos. Igrejas saudáveis sabem que os seus pastores ouvem seus questionamentos e que vão abordá-los. Mas também esperam que seus pastores preguem sobre textos e temas que podem inicialmente parecer irrelevantes, confiando que toda a Escritura é proveitosa (2 Tm. 3.16-17) Creem que seus pastores se esforçam para conhecer as necessidades de sua igreja, se possível, melhor do que eles mesmos.

A melhor pregação expositiva fala às necessidades sem deixar que estas definam a agenda. Se o expositor fizer a exegese tanto da Bíblia como da audiência, abordará as necessidades genuínas e redefinirá as necessidades aparentes, tal como Jesus o fez.

Traduzido por Bruno Nunes.

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