Em novembro de 2012, os cidadãos do estado americano do Colorado votaram a Emenda 64, uma emenda à Constituição do seu estado que permitiria o “uso pessoal e regulação da maconha” para adultos acima de 21 anos de idade, bem como o cultivo comercial, fabricação e venda, regulamentando de forma efetiva a cannabis de forma semelhante ao álcool. As primeiras lojas vendendo maconha para uso recreativo inauguraram oficialmente em primeiro de janeiro de 2014.
Enquanto a nova legislação só se aplica ao Colorado (o estado de Washington aprovou uma medida similar, mas a maconha ainda é ilegal em todos os outros estados e em nível federal), os americanos de todo o país estão começando a examinar questões relacionadas ao uso de maconha. Para os cristãos, uma das questões mais pertinentes é se o uso recreativo da maconha é pecaminoso.
Embora muitos cristãos considerem a resposta à pergunta como sendo bastante simples, pode ser útil examinar o processo de raciocínio que nos permite determinar como princípios bíblicos podem ser aplicados a esta questão.
O Que a Bíblia Diz Sobre a Maconha?
Como o aborto, armas nucleares e muitas outras controvérsias modernas, a Bíblia não menciona especificamente a maconha. No entanto, alguns defensores da maconha apelam, sim, para a Bíblia (de fato, para seu primeiro capítulo) para sustentar sua posição:
“E disse Deus ainda: ‘Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento. (Gn 1:29)
Uma vez que a maconha é realmente uma planta com sementes, podemos legitimamente considerar se Deus deu-a para nós para “mantimento”. Antes de fazer isso, porém, devemos observar como essa reivindicação exclui a forma mais popular de uso recreativo da maconha: o fumo. Não há outros alimentos (nem mesmo salmão defumado) que consumimos fumando-os. Portanto, este argumento só pode aplicar-se a usar maconha constituída como alimento e consumida em algo comestível.
Presumivelmente, ninguém acrescenta maconha em um brownie porque melhora seu sabor. A razão de adicionar esta planta particular aos alimentos é por causa de seus efeitos sobre outros sentidos que não o paladar. No entanto, vamos supor que alguém realmente desfrute e ganhe alguma nutrição ao comer folhas de maconha. Seria isso um pecado?
Raciocínio Analógico e a Bíblia
Para dar uma resposta embasada na Escritura e na ética cristã, devemos usar o raciocínio analógico. Em seu ensaio “O lugar das Escrituras na ética cristã”, James Gustafson afirma o método comumente aceito de analogia bíblica:
“Essas ações de pessoas e grupos devem ser julgadas moralmente erradas se são semelhantes às ações que são julgadas erradas ou contra a vontade de Deus em circunstâncias semelhantes nas Escrituras, ou são discordantes com ações julgadas corretas ou de acordo com a vontade de Deus nas Escrituras”.
Ao passo que isto pode parecer bastante óbvio, também levanta a questão de como podemos determinar se uma ação ou circunstância é semelhante a uma ação julgada errada nas Escrituras. O jurista Cass Sunstein explica como aplicar o raciocínio analógico:
Esse tipo de pensamento tem uma estrutura simples: (1) A possui a característica X; (2) B compartilha essa característica; (3) A também possui a característica Y; (4) Porque A e B compartilham a característica X, conclui-se algo que ainda não sabido: que A e B compartilham também a característica Y.
Existe uma ação analógica que é considerado errada ou contra a vontade de Deus que seja semelhante ao uso recreativo da maconha? Na verdade, há um claro exemplo que é frequentemente mencionado na Bíblia: embriaguez (no final deste artigo há várias referências bíblicas sobre embriaguez e sobriedade). Embriaguez na Bíblia é o estado de intoxicação pelo álcool.
A (intoxicação por ingestão de álcool) possui a característica X (produz efeito psicoativo, ou seja, afeta o funcionamento do cérebro, resultando em alterações na percepção, humor, consciência, cognição e comportamento). B (intoxicação por ingestão da maconha) compartilha essa característica; uma vez que A e B compartilham a característica X, conclui-se o que ainda não é sabido, que A e B também compartilham a característica Y (é uma ação julgada contra a vontade de Deus, ou seja, é pecaminosa).
Raciocinando por analogia, podemos determinar que uma vez que é pecaminoso intoxicar-se por álcool, é pecaminoso intoxicar-se por maconha.
O Que Constitui a Intoxicação?
O argumento analógico contra o uso recreativo da maconha parece bastante incontroverso. No entanto, a Bíblia proíbe a embriaguez, mas não proíbe todos os usos do álcool, inclusive aqueles para fins recreativos. Uma pessoa pode consumir pequenas quantidades de álcool sem qualquer intenção de ficar intoxicado. Pode alguém consumir pequenas quantidades de maconha sem qualquer intenção de intoxicar-se?
Para responder à pergunta é preciso determinar a quantidade média de droga — álcool ou maconha — necessária para produzir o estado de debilitação.
Para o álcool, a unidade de medida é a “bebida padrão”, ou seja, qualquer bebida que contém cerca de 14 gramas de álcool puro (cerca de 18 ml ou 1,2 colheres de sopa). A bebida padrão é convencionalmente definida como a quantidade de álcool em 355 ml (uma lata) de cerveja com 5% de teor alcoólico, 148 ml de vinho com 12% de teor alcoólico ou 44 ml (uma dose) de destilados com 40% de teor alcoólico. Na maioria dos estados americanos, o nível legalmente definido de intoxicação geralmente ocorre, dependendo do ritmo, depois de quatro bebidas, para uma mulher de porte médio, ou cinco, para um homem de porte médio.
Para a maconha, no entanto, uma dosagem muito mais baixa é necessária para induzir um estado de intoxicação. Estudos mostram que a intoxicação ocorre pela ingestão de menos de 7 mg de THC (o ingrediente psicoactivo na maconha). Isto equivale aproximadamente a quatro tragadas de um cigarro de maconha.
Se o propósito de consumir a maconha fosse nutrição e paladar, seria preciso comer apenas uma quantidade que não causasse o efeito intoxicante — cerca de 200 mg de folhas de maconha. Teoricamente, então, poderia ser possível ingerir maconha sem intenções pecaminosas. Mas é claro que, em quase todos os casos, o uso recreativo da maconha é feito com a intenção de alcançar um certo nível de intoxicação; e se a intenção do uso recreativo da maconha é alcançar algum nível de intoxicação, então é claramente um motivo e uma ação pecaminosa.
Uma amostragem de versículos bíblicos relacionados à embriaguez e sobriedade:
Efésios 5:18 – “E não vos embriagueis com vinho, no qual há dissolução, mas enchei-vos do Espírito.”
Gálatas 5:21 – “Invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.”
1Pedro 5:8 – “Sede sóbrios e vigilantes.”
1Coríntios 6:10 – “Nem ladrões, nem avarentos, nem bêbados, nem maldizentes, nem roubadores herdarão o reino de Deus.”
Provérbios 23:20-21 – “Não estejas entre os bebedores de vinho nem entre os comilões de carne.. Porque o beberrão e o comilão caem em pobreza, e a sonolência vestirá de trapos o homem”
Provérbios 23:29-35 – “Para quem são os ais? Para quem, os pesares? Para quem, as rixas? Para quem, as queixas? Para quem, as feridas sem causa? E para quem, os olhos vermelhos? Para os que se demoram em beber vinho, para os que andam buscando bebida misturada. Não olhes para o vinho, quando se mostra vermelho, quando resplandece no copo e se escoa suavemente. Pois ao cabo morderá como a cobra e picará como o basilisco. Os teus olhos verão coisas esquisitas, e seu coração falará perversidades.”
Isaías 5:11 – “Ai dos que se levantam pela manhã e seguem a bebedice e ali continuam até alta noite, até que o vinho os esquenta!”
Oséias 4:11 – “A sensualidade, o vinho e o mosto tiram o entendimento.”
1 Coríntios 5:11 – “Mas, agora, vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal, nem ainda comais.”
Isaías 28:7 – “Mas também estes cambaleiam por causa do vinho e não podem ter-se em pé por causa da bebida forte; o sacerdote e o profeta cambaleiam por causa da bebida forte, são vencidos pelo vinho, não podem ter-se em pé por causa da bebida forte; erram na visão, tropeçam no juízo.”
Mateus 24:48-49 – “Mas, se aquele servo, sendo mau, disser consigo mesmo: ‘Meu senhor demora-se’, e passar a espancar os seus companheiros e a comer e beber com ébrios…”
