Estes são tempos que provam as almas dos homens, mas quem é o inimigo, o maior inimigo, do povo de Deus?
Talvez sejam os juízes liberais do Supremo Tribunal Federal e a ética sexual da sociedade secular. Ou talvez seja o Estado Islâmico e a ameaça do islamismo radical. Talvez seja o rápido aumento dos que não se identificam com nenhuma religião. Ou talvez seja a Planned Parenthood e outros que defendem o direito ao conforto de um adulto em lugar do direito de uma criança à vida e, barbaramente, extinguem a vida no útero, lugar que foi criado para sua proteção e crescimento.
Ao olhar para o mundo ao nosso redor hoje, a partir da minha visão limitada, não sei a resposta para esta pergunta; pelo menos, não sei a resposta completa. Mas conheço a resposta que o livro de Juízes dá, que é a mesma resposta que toda a Bíblia dá. De acordo com Juízes, se o povo de Deus quer saber quem é o seu maior inimigo potencial, ele precisa fazer apenas uma coisa bem simples: olhar no espelho.
O Verdadeiro Inimigo em Juízes
No tempo dos juízes, haviam inimigos assustadores e fortes. Eles oprimiam, saqueavam e estupravam, como quisessem. E tenho certeza que, se fizéssemos algumas entrevistas na rua, teríamos ouvido todos os tipos de razões externas para os seus problemas. “Eles têm carruagens e nós não”, um israelita poderia ter dito. “Eles lutam melhor nas planícies do que nós”, diz outro. Ou, “Eles têm melhores generais, melhores reis; é por isso que nós não estamos herdando a terra.”
Talvez o jornal do dia até tivesse trazido manchetes contando esta triste história. Mas se o tivesse feito, teria sido um relato superficial. Estas não eram as questões mais profundas. Os maiores inimigos não eram externos, mas internos. E o livro de Juízes tanto brada quanto sussurra essa acusação.
Considere a última frase no livro. “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada um fazia o que parecia bem aos seus olhos.” (Juízes 21:25; veja também Juízes 17:6). Esta declaração é o equivalente antigo do negrito, itálico, sublinhado e letras maiúsculas; um exemplo do livro bradando que o maior inimigo é interno.
Outro texto é Juízes 2:10, que é um versículo chave no livro. Aqui a culpa é colocada sobre o fato de que ” levantou-se outra geração que não conhecia ao Senhor, nem tampouco a obra que ele fizera a Israel.” Mais uma vez, o inimigo é interno, não externo
Mas o livro também sussurra essa mensagem. Por exemplo, considere o juiz Tolá (Juízes 10:1-2). Ele, assim como outro chamado Sangar, foi um libertador mencionado apenas em um versículo ou dois (Juízes 3:31). Mas, ao contrário de Sangar, que liberta o povo de um inimigo externo (os filisteus), nenhum inimigo está listado como tendo lutado contra Tolá. Quando Tolá vem para salvar, ele salva Israel de Israel.
E é por isso que o livro, como um todo, conclui com um apêndice de histórias sórdidas provavelmente de um período anterior no livro, histórias de um sacerdote ganancioso, um levita que desmembrou sua concubina, e uma guerra civil que quase aniquilou uma das tribos. Inimigos internos, não externos.
O Verdadeiro Inimigo na Bíblia
Mas não é só Juízes que enfatiza este aspecto, não é? Através das alianças e de autores (de Abraão, a David, ao exílio, à igreja, à segunda vinda) o maior problema é a pureza e fidelidade da nossa fé.
Pedro fala de Satanás como o nosso “inimigo” e um “leão que ruge” (1 Pedro 5:8), e Paulo escreve sobre nossa batalha contra as “forças espirituais” (Efésios 6:12), mas quando Adão nos colocou em rebelião contra Deus, sua desculpa de que “o diabo me fez fazer isso” não colou. Adão e Eva deixaram de se deleitar em Deus. Claro, havia um inimigo externo, mas foi a fé deles, sua vida interior, que foi mais importante, levando-os à queda.
Considere quando os doze espiões fizeram o reconhecimento de Canaã em Números 13-14. Eles se sentiram como gafanhotos encarando gigantes, mas a verdade é que a questão nunca foi o seu tamanho, mas sim, “será que Israel confiaria no Deus dos gafanhotos”?
E que tal o final de Romanos 1? Depois de uma lista de pecados notórios, o verdadeiro soco no estômago é para os tipos religiosos, isto é, aqueles que deveriam saber, mas, aparentemente, não sabiam (Romanos 1:32).
Considere também as cartas para as igrejas no livro do Apocalipse. A questão não era apenas que alguém, em algum lugar do mundo, estava ensinando alguma coisa errada, digamos, a “doutrina de Balaão” ou dos “Nicolaítas”. Em vez disso, o problema era que alguns na igreja “aderiram” a este ensino (Apocalipse 2: 14-15). E, com certeza, em Tiatira “aquela mulher Jezabel” fazia o que queria, mas Deus estava no controle (“Dei-lhe tempo para que se arrependesse […] Eis que a lanço num leito de dores […], e ferirei de morte,” Apocalipse 2:20-24). A maior ameaça para a igreja é a possibilidade dela “aderir” ao ensino de Jezabel, ao invés de permanecer fiel à Deus.
Poderíamos continuar, mas o ponto é claro: Não só Juízes, mas toda a Escritura, ensina que o maior inimigo do povo de Deus é interno.
Reconheceremos Nós Este Inimigo?
No entanto, resistimos profundamente a este ensino. Não me crê? A sua igreja tem uma lista de pedidos de oração? Quantos estão relacionados com a apatia espiritual, o temor do Senhor, o amor pelos perdidos, as divisões entre os irmãos e irmãs, e nosso sincretismo sutil? Quantos pedidos de oração fazemos para encontrarmos a nossa maior alegria no deleite de nosso Pai sobre nós por causa do evangelho? Não o suficiente.
Amigos, a maior ameaça à Igreja não é o Estado Islâmico ou a Planned Parenthood. Não é Hollywood. Não são os professores ateus que arruínam a fé de nossos queridos calouros cristãos na faculdade (que, afinal, não deviam ser verdadeiramente cristãos, do contrário não se afastariam tão rapidamente). Os maiores inimigos não são os políticos seculares e os juízes do STF, ou as corporações gananciosas que ferem os pobres e destroem o meio ambiente.
Estes desafios são reais. A realidade de bebês mortos, picados e vendidos como sucata de metal é maligna. E o general cananeu Sísera, que “oprimia o povo de Israel cruelmente” e que estuprou mulheres capturadas, era também maligno (Juízes 4:3; 5:28-30). No entanto, foi quando o povo de Deus “Abandonou Javé, Deus de seus pais […], e servindo a baalins e astarotes. (Juízes 2:13), quando sua fé perdeu a pureza e fidelidade, e quando a idolatria interna (não externa) se tornou pandêmica, que as coisas degringolaram.
Se quisermos saber quem é o pior inimigo (aquele que poderia nos destruir eternamente, se não fosse a graça sustentadora de Deus,), então temos de olhar no espelho. Fazer isso não será fácil; será desconfortável. Mas uma boa olhada em nossas próprias almas e no pecado que habita em nós pode identificar este câncer enquanto há tempo. E, se isto acontecer, podemos louvar a Deus por termos o evangelho para nossa cura.
Publicado originalmente em Desiring God
Traduzido por Karine Cunha de Souza