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É Hora de Lidarmos com o Poder da Celebridade

Não foi uma semana ótima. Em três casos separados em meus círculos imediatos, uma pessoa com poder significativo no topo de uma organização, cada uma sujeita a uma exposição da mídia durante sua carreira, foi confrontada com alegações de má conduta sexual e delitos associados. Em um caso, a pessoa renunciou ao cargo e a cargos em conselhos de direçāo, e isto foi acompanhado por uma confissão direta e cheia de remorso. No segundo, a pessoa renunciou, mas não sem postar uma negativa altiva de todas as alegações contra ela. Na terceira, a pessoa também negou todas as alegações nos termos mais fortes—em certo ponto com força física, batendo em uma mesa—e, enquanto escrevo isto, ainda permanece em sua posição.

Todos os três eram, ou pelo menos uma vez foram, vistos como líderes cristãos exemplares de sua geração, inclusive por muitos que trabalharam de perto com eles. Embora eu não tenha um relacionamento próximo com nenhum dos três, vicenciei e me beneficiei de seus dons excepcionais de liderança e ministério, assim como milhares ou milhões de outros.

Não vou mencionar seus nomes aqui. Se você estiver na esfera de influência deles, já sofreu o impacto das revelações da semana, e não há necessidade de redobrar o trauma. Se nāo estiver, então o desejo de saber seus nomes, embora seja compreensível e humano, é um desejo lascivo que não vou satisfazer. E embora eu esteja orando para que esta tríplice tragédia não mais ocorra frequentemente em uma única semana, a verdade é que eu poderia ter escrito este ensaio muitas vezes nas últimas décadas, e terei a oportunidade de fazê-lo muitas vezes no futuro. Os nomes na realidade, não são tão importantes para meus propósitos — é o sistema no qual não apenas eles, mas nós também, somos profundamente cúmplices.

Nossa Cumplicidade com o Poder da Celebridade

Na verdade, são dois sistemas. O primeiro é aquele, quase tão antigo quanto a própria humanidade, que dá aos poderosos a oportunidade de explorar, saquear, assassinar e—por último, pior, e talvez o mais comum de todos—estuprar. Por comando direto ou por mera implicação ( “Não haverá ninguém capaz de me livrar deste padre turbulento?”), aqueles em posições de poder têm sido capazes de realizar suas fantasias e queixas—não diferindo em espécie daquilo que o resto de nós desejaria fazer, sem ter os meios para realizá-los.

Entre os muitos dons obscuros do poder está a distância—distância da responsabilidade, distância das consequências, distância da dor que causamos aos outros, distância do autoconhecimento, distância da amizade, distância da verdade. O terraço da casa real, a entrada dos fundos, o banheiro executivo, o jato particular, sem mencionar o que os críticos de Andrew Jackson chamavam de “gabinete executivo da cozinha” e o que C.S. Lewis chamava de Círculo Interior — as acomodações que nos escondem da vista dos outros, os aderentes que são na verdade dependentes, se não bajuladores, os apetrechos da negação plausível.

Nesta privacidade e àquela distância, nos tornamos capazes de atos que nunca teríamos imaginado. (Se todas as alegações desta semana forem verdadeiras — o que eu não tenho meios de saber, e absolutamente não presumo ser o caso — e as negações desses líderes forem mentiras, parte da veemência das mentiras é incapacidade deles de compreender verdadeiramente que deixaram tão completamente de viver de acordo com seus próprios ideais.) Isso é verdade desde que a sociedade humana se tornou complexa o suficiente para conceder a algumas pessoas o poder de se distanciarem desta maneira — e de certa forma, era verdade mesmo quando a sociedade humana era apenas dois irmãos em um campo, fora da vista dos únicos parentes que eles tinham no mundo.

Esta parte do problema — a distância do poder e seus efeitos distorcidos sobre os poderosos — é antiga e nunca desaparecerá. Mas é agravada por algo genuinamente novo: o fenômeno da celebridade. A celebridade combina a velha distância do poder com o que parece ser exatamente o oposto — a intimidade extraordinária, ou pelo menos uma simulação encantadora de intimidade.

É o poder do one-shot (o rosto preenchendo o quadro), o microfone próximo (a voz caindo para o sussurro de um amante), o livro de memórias (as revelações que nunca haviam sido discutidas com o pastor do autor, pais, ou às vezes até amante ou cônjuge, antes de serem publicadas), o tweet, a selfie, a insta, o snap. Tudo isso nos dá a capacidade de parecer conhecer alguém — sem de fato conhecer muito sobre eles, já que no final sabemos apenas o que eles, e os sistemas de poder que crescem ao seu redor, desejam que saibamos.

Pois sistemas de poder realmente crescem em torno do fenômeno moderno da celebridade, porque, à sua maneira, é muito mais poderoso do que o antigo regime de posição, status e coerção. A distância daquele antigo regime dava àqueles em seu cume uma espécie de poder, sem dúvida, mas também uma espécie de vulnerabilidade, porque a distância funcionava nos dois sentidos. Fora do alcance dos ouvidos do rei, os membros da corte podiam resmungar e os guarda-costas podiam conspirar. No campo dos senhores, os camponeses podiam reclamar. Os trabalhadores podiam fazer piadas sobre o “Homem”, e as crianças nos cantos podiam se espalhar muito antes que a polícia chegasse. O novo regime de intimidade é sempre muito mais poderoso porque se baseia fundamentalmente não no medo, na coerção e na distância — pelo menos a princípio — mas no desejo e imaginação e, de fato, no eros, o desejo de união.

As celebridades personificam quem nós desejamos nos tornar e nos convidam — assim parece — para o círculo interior de suas vidas. Nós somos o seu “gabinete executivo de cozinha”, estamos tão perto de estar em seu Círculo Interior. Eles são tão desconcertantemente transparentes conosco. Eles nos contam muito da verdade. Vivem em nossas próprias imaginações, seus rostos mais familiares para nós do que o de nossos vizinhos, ou até mesmo alguns daqueles que chamamos, informalmente, na maneira norte-americana, nossos amigos. Eles nos inspiram, sendo ordinários em sua extraordinariedade, assegurando-nos que são pessoas como nós e, portanto, que podemos ser pessoas como eles. Acima de tudo, eles nos acenam para que nos aproximemos.

Mundo Institucional Evanescente

Durante séculos, milênios realmente, filósofos e teóricos políticos buscaram uma maneira de domar a arbitrariedade do poder distante. Num ritmo glacial — tomando diferentes rumos se compararmos a China após Confúcio com o Ocidente após Platão e Cícero — as sociedades gradualmente cercaram aqueles que estão no auge do poder com o que convencionalmente chamamos de instituições, sistemas maiores que os poderosos, que detinham o poder de responsabilizar os poderosos. Nenhum destes sistemas chegou perto da perfeição e as próprias instituições podiam ser utilizadas para fins terríveis.

Mas mesmo assim, durante um longo período de tempo e com inúmeros trancos e barrancos, aprendemos algo sobre como domar aquilo que há de pior no poder. Havia necessidade de justificar a coerção e a violência poderia ser remediada; chegamos a crer em e, em alguma medida não trivial, nos tornamos nações de leis, não de homens. Nos Estados Unidos, onde este experimento foi, em muitos aspectos, levado à sua extensão máxima, os poderes foram separados em muitos contextos — não apenas nos três ramos do governo, mas em organizações de muitos tipos, nos oficiais solenemente eleitos em inúmeros clubes. e sociedades fraternas, em presbitérios e conselhos de anciãos, na exigência legal de ter membros de conselho diretor independentes em companhias de capital aberto.

Nossos avós e bisavós construíram instituições extraordinárias, de muitos tipos, ao longo destas linhas, incluindo as igrejas cujos edifícios imponentes ainda se alinham em muitas praças e ruas no centro de cidades. Estas instituições não eram perfeitas e perpetuavam muitos tipos de injustiça. Mas, em seus melhores aspectos, preservavam e davam expressão a uma ideia profunda e radical: que as melhores coisas que os seres humanos fazem juntas são maiores e mais duradouras do que qualquer pessoa que possa ocupar uma posição temporária de poder.

Não é errado ficarmos ofendidos pela homogeneidade dos rostos de ex-presidentes que nos olham de retratos sequenciais em corredores institucionais (homens brancos em alguns, homens negros em outros, já que os afro-americanos desenvolveram de forma tão determinada e orgulhosa suas próprias instituições nos anos após a emancipação). Mas também não é errado nos maravilharmos com o quanto eles são anônimos para nós e, em grande parte, para seus próprios contemporâneos; como quanto eles se viam como mordomos e não como proprietários únicos; quanta continuidade eles preservaram mesmo quando lideraram mudanças necessárias; o quão pacificamente e graciosamente eles passaram a liderança de um para o outro.

Seu mundo era um mundo institucional. Mas agora, ele está quase totalmente desaparecido.

Desapareceu porque o poder da celebridade passou pelos veneráveis edifícios institucionais e pelas veneráveis pessoas que edificaram instituições na geração dos nossos avós, como um tornado. No Salão Oval de nosso país, há um homem com a idade emocional aparente, baseado em sua personalidade pública, de uma criança de 8 anos, embora com a libido de uma criança de 15 anos. Ele não pode manter-se fiel a alguém, com toda a probabilidade, porque na verdade ele não compreende totalmente a existência de alguém além de si mesmo. E ele é simplesmente brilhante em manipular o poder da celebridade.

Ele colonizou a imaginação de nós todos — acima de tudo, suspeita-se, a imaginação dos que mais o odeiam, que não conseguem passar uma hora por dia sem pensar nele. Ele sempre aspirou ser, e agora é, a celebridade suprema — alguém que conhecemos muito bem, mas que não conhecemos de maneira alguma, porque na verdade não há ninguém lá para ser verdadeiramente conhecido. Ele nunca buscou verdadeiramente nada além da validação da fama e do poder exclusivamente moderno que ela traz, mas tendo buscado aquela coisa, em uma inversão demoníaca da promessa do evangelho, todas essas outras coisas foram adicionadas a ele também—incluindo a distância fatal que ainda pode permitir que ele faça qualquer coisa que lhe agrade, até e incluindo a guerra total.

Pelo menos isto coloca essa semana em perspectiva.

Estrada Menos Percorrida

Poderia ter sido diferente para a igreja. Havia uma e apenas uma celebridade no mundo de Jesus, uma face em cada moeda, um nome nos lábios de todos. E quando mostraram a Jesus a face e a moeda, ele sugeriu, com desdém, que a moeda fosse devolvida àquele que estava tão ansioso para estampar sua imagem em todos os cantos do império. Dai a César a moeda do seu reino, Jesus disse — e dai a Deus o que quer que seja, ou quem quer que seja, que tenha a sua imagem (Mc 12.17). A imagem visível do Deus invisível não deixou retrato. A única vez que ele escreveu, escreveu no pó (Jo 8.6). Ele tinha uma maneira diferente de usar o poder no mundo, uma maneira que acabou por durar mais que todos os imperadores, incluindo imperadores cristãos.

Ele não oferecia falsa intimidade — seu biógrafo, João, disse que não se confiava a eles, porque ele sabia o que era a natureza humana (Jo 2.24-25) — mas também não se mantinha distante. Ele deixou as crianças virem a ele (Mt 19.14). Ele deixou Maria sentar-se a seus pés e deixou outra Maria lavar seus pés com suas lágrimas (Lc 7.36-50; 10.39). Pendurado nu em uma cruz, ele perdoou, abençoou e certificou-se que ainda outra Maria ainda teria um filho (Lc 23.34,43; Jo 19.26). Seu poder, verdadeiramente, não era deste mundo.

Visto que o poder da celebridade superou o poder das instituições na segunda metade do século XX, poderíamos ter feito uma escolha diferente em nossas igrejas. De fato, algumas igrejas e alguns líderes fizeram isto. O padre anglicano John Stott foi uma figura incomparavelmente poderosa, no melhor sentido, no mundo evangélico do século XX. Ele viveu com uma indiferença divina ao poder. Ele passou longos períodos não celebrados de sua vida e ministério naquilo que nos anos da Guerra Fria era chamado de “Terceiro Mundo”, muito antes dos relatos da viagem de missão do Instagram. Ele era reservado, como quase todos os homens britânicos de sua geração e classe aprenderam a ser. Nunca se casou. No entanto, sua vida foi totalmente aberta a amigos de todo o mundo, aos assistentes (sempre masculinos) que ele convidava para o local mais íntimo que um reitor anglicano possui — seu estudo — e à sua secretária pessoal de 55 anos, Frances Whitehead. Os frutos de sua vida são incalculáveis.

Quando jovem, eu ficava impaciente com alguns pontos da teologia de Stott. Eu o achava insuficientemente criativo, insuficientemente imaginativo em resposta à imagem criativa implantada nos seres humanos e na Palavra viva de Deus. E, de certa forma, continuo achando. Mas à medida que envelheço fico cada vez mais impressionado com os líderes que ele promoveu, as instituições que construiu e serviu, e o legado que deixou — embora por ter tido a infelicidade de viver antes das mídias sociais, provavelmente apenas uma em cada cem pessoas que se denominam “evangélicas” conhece o seu nome.

Da mesma forma, Billy Graham. Eu nunca segui o “princípio de Billy Graham” que diz que um homem nunca deve estar sozinho com uma mulher que não seja sua esposa — parece-me que atrapalha de inúmeras maneiras, sobretudo porque pode roubar às mulheres a chance de influenciar homens e de serem orientadas e elevadas no poder formal e informal que devem possuir pelo dom do Espírito de Deus. Mas a maioria das pessoas esqueceu o contexto dessa regra, que era um conjunto mais amplo de compromissos, elaborados em um quarto de hotel em Modesto, Califórnia, com o temor de que os abusos de poder que caracterizaram várias gerações de “evangelistas” enredassem o jovem evangelista e sua equipe. Eles firmaram quatro compromissos, não apenas aquele — igualmente importantes foram seus compromissos com a transparência financeira e simplicidade, a honestidade absoluta em seus relatórios de números e conversões, e, talvez mais notavelmente para nossos propósitos, sempre em parceria com a igreja local.

Graham cometeu erros graves, como admitiu mais tarde em sua vida, sobretudo quando sua celebridade cruzou com a distância tóxica, a privacidade e a paranoia de Richard Nixon. Ele provavelmente tinha maior celebridade do que era saudável para ele, sua família e para o avivamento que procurava liderar. Mas a maneira como ele temperou sua celebridade com a simplicidade, responsabilidade e limites voluntários em seu poder é o caminho menos percorrido, e na contabilidade eterna de sua vida pode muito bem ser o que fez toda a diferença.

Stott e Graham se foram. As instituições que eles trabalharam duro para construir são frágeis, embora não estejam fadadas a desaparecer. Há ainda inúmeros pastores, evangelistas e outros líderes no cristianismo norte-americano que vivem vidas modestas, se submetem a outros por reverência a Cristo e estão construindo algo maior do que eles mesmos. Mas as revelações desta semana nos relembram que estamos em uma posição perigosa. Não porque as alegações sejam necessariamente verdadeiras, mas porque muitas de nossas instituições aparentemente mais fortes são realmente fracas da maneira mais importante: elas não são fortes o suficiente para nos convencer de que as alegações contra seus líderes não são verdadeiras.

Os fatos mais condenatórios nos desanimadores e-mails e reportagens que passaram por minha escrivaninha esta semana não são sobre as ações alegadas de certos líderes — que do meu ponto de vista limitado não podem ser tratados como fatos — mas as reações incertas e parciais dos sistemas em torno destes líderes.

Quando conselhos são dependentes dos fundadores; quando presbíteros permitem que seja dito publicamente que “ninguém pode substituir” um pastor sênior; quando os sistemas de informação podem gerar o número de e-mails trocados entre um líder sênior e uma determinada pessoa, mas de alguma forma o conteúdo não é recuperável — nada disso significa que qualquer malversação foi cometida. Mas isto significa que a atração gravitacional dessas figuras carismáticas anulou a capacidade da instituição de se proteger (e na verdade proteger seu líder), de alegações legítimas e falsificadas de má conduta.

E quaisquer que sejam os fatos de qualquer caso, qualquer um que tenha estado nos bastidores de eventos cristãos sabe o quão distantes, quão intocáveis, quão protegidas são certas celebridades que no palco parecem tão transparentes, tão naturais, tão desprotegidas. Mesmo que nenhuma das alegações que li sobre esta semana possa ser provada, a transmutação do poder da intimidade na distância do poder é uma característica inescapável de muitas de nossas igrejas e ministérios.

A Mudança Começa Conosco — Começa Comigo

Necessitamos de mudanças profundas e começa menos com nossas figuras públicas e mais que com nós mesmos. Paradoxalmente, vamos necessitar de ter uma expectativa de menor transparência de nossas figuras públicas, menos sedutoras exibições de intimidade e “vulnerabilidade” e maior responsabilidade dos sistemas ao redor delas. Necessitaremos colocar mais energia edificando sistemas, incluindo sistemas que levem em conta as tentações do poder, que durarão por gerações. Necessitamos, de alguma forma, sufocar nossa luxúria de nos sentirmos próximos de pessoas que podem encantar a câmera e manter os holofotes — reconhecendo que a meia-vida de tal liderança sempre foi medida em anos, não em gerações, e agora está contada em algo mais parecido meses ou dias. Necessitamos nos comprometer com instituições que mantiveram sua integridade, às vezes por meio de dolorosos episódios públicos de responsabilização. Eu participo do conselho de curadores de duas dessas organizações, e há muitas, muitas mais.

Enquanto isso, aqueles de nós que se encontram com uma medida de fama pública devem assumir compromissos radicais para limitar nosso poder. Eu mesmo tentei fazer isso quando percebi que meu perfil público e influência estavam crescendo. Alguns dos meus compromissos devem permanecer confidenciais — para que minha mão direita não saiba o que minha mão esquerda está fazendo, muito menos minha mão direita no Instagram, o que minha mão esquerda está fazendo — mas posso citar pelo menos alguns deles.

Servi ao lado de, aprendi de, orientei e promovi mulheres, e as mulheres de todas as gerações que são minhas parceiras no ministério do evangelho estão entre as grandes dádivas da minha vida. Muitas vezes tenho boas razões para encontrá-las um a um (embora também tenha constatado que quase todo o trabalho, ministério e até mesmo aconselhamento são mais frutíferos em grupos de três ou quatro do que em duas pessoas). Por duas décadas, tem sido minha prática intencional que nos encontremos em lugares públicos e, nas raras ocasiões em que nos encontramos durante o jantar, é no início da noite e na parte da frente do restaurante, não nos fundos. Minha esposa, Catherine, sabe de todas estas reuniões com antecedência e lhe relato as conversas depois. Catherine tem todas as minhas senhas de computador. Asseguro-me de que toda mulher que confie algo profundamente confidencial a mim compreenda que também está confiando isto à Catherine.

Eu me juntei a uma organização que não fundei, liderada por um CEO a quem eu reporto, que, por sua vez, se reporta a uma diretoria independente, séria e competente, e eu passei 12 anos antes disto trabalhando para outra organização. Envio todas as minhas decisões de viagem e palestras para o meu CEO, bem como para Catherine, e finalmente consegui mudar de carreira como freelancer quando a renda fluia para minha empresa individual, para uma onde todas as remunerações fluem para a organização. Publico online as taxas e termos para fazer palestras. Minimizo meu uso de agentes que teriam um incentivo financeiro para aumentar minha fama e se interpor entre mim e as igrejas e ministérios que desejam me envolver como orador. (Eu tenho uma agente literária, mas ela é eminente e inabalavelmente sã.) Em conferências que oferecem aos palestrantes uma “sala verde”, eu a uso apenas para oração e preparação imediatamente antes de fazer a palestra. O resto do tempo, me sento na plateia como todo mundo. Em eventos que usam etiquetas de nome, eu uso uma.

Todo domingo eu descanso. Todo verão desligo meu e-mail por duas semanas. (Minha mensagem de férias começa: “Infelizmente, nunca vou ler seu e-mail.”) A cada sete anos, pretendo deixar meu trabalho diário e todo o significado que ele me dá. Duas vezes estas férias sabáticas vieram porque o que eu estava tentando fazer fracassara. Aqueles foram os períodos mais criativamente frutíferos da minha vida.

Todo mês de janeiro encontro-me com outros sete homens que têm posições semelhantes de liderança pública. Nós nos denominamos “Os Eulogistas”. Nosso objetivo é nos conhecermos tão bem, e por tanto tempo, que seremos capazes de dar um relato genuíno, honesto e completo das vidas uns dos outros em nossos funerais. Também pretendemos nos responsabilizar por vidas que valham a pena um tributo funerário. Somos implacavelmente transparentes uns com os outros. Eu lhes contei tudo de substância que há para saber sobre minha vida, minhas tentações, minhas consolações e minhas desolações, e nós choramos, oramos e nos regozijamos juntos. Isto é tudo o que vou contar sobre os Eulogistas.

É isto o que eu faço. Os detalhes são menos importantes do que a razão por trás deles. Pus tudo isso no lugar porque, ainda assim, se você conhecesse todas as condições do meu coração, minhas fantasias e queixas, minhas ansiedades e meus mais sombrios pensamentos solitários, você me declararia um perigo para mim e para os outros. Eu não posso ser confiado com poder sozinho, certamente também não com a celebridade, e nem você pode.

Mas não precisamos confiar em nós mesmos para isto. Podemos estar constantemente despojando-nos de poder, confiando-o aos outros, reinvestindo qualquer poder que recebamos em uma comunidade que durará mais do que nossas vidas curtas, construindo algo que durará até mesmo para os filhos de nossos filhos — uma comunidade perante a qual somos genuinamente responsáveis, uma comunidade que nos resgatará de nós mesmos e nos libertará para sermos as pessoas que queríamos ser, as pessoas que sabíamos que poderíamos ser, quando começamos esta jornada de vida, cheios de coração e de esperança.

Não é tarde demais — para os três nomes pelos quais lamento esta semana, para os nomes que você conhece e sofre, por mim, para a igreja, talvez até para a nossa nação. É bastante tarde, mas na bondade e graça de Deus, não é tarde demais.

Traduzido por Thaisa Marques

 

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