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Eu era uma estudante na Universidade de Cambridge quando pela primeira vez me debati com Efésios 5.22. Vinha de um colégio com ênfase acadêmica e que era segregado por gênero e orientado à igualdade. Fiquei repugnada. “As mulheres sejam submissas ao seu próprio marido, como ao Senhor.” Só podia ser brincadeira.

Tive três grandes problemas com este versículo.

O primeiro era o postulado de que as esposas devem ser submissas. Eu sabia que as mulheres são tão competentes quanto os homens — muitas vezes mais do que eles. Pensava que se há sabedoria na tomada de decisões assimétricas no casamento, certamente isto dependeria de quem fosse mais competente naquela área: às vezes o marido, às vezes a esposa.

O segundo problema era a ideia de que as esposas deveriam se submeter aos seus maridos “como ao Senhor”. Uma coisa é se submeter a Jesus Cristo, o Rei do universo que se sacrificou a si mesmo. Outra bem diferente é submeter-se a um homem falível e pecador — mesmo como uma parte minúscula de uma submissão muito maior a Cristo.

O terceiro problema — que talvez fosse o que mais me entristecesse — era o quanto achava que esse versículo era prejudicial ao meu testemunho do Evangelho. Eu estava oferecendo aos meus amigos incrédulos uma narrativa radical de inversão de poder, na qual o Deus Criador entregou sua vida, na qual os pobres superam os ricos e na qual os marginalizados se tornam família. O Evangelho é um fogo consumidor de amor para ultrapassar as diferenças, com o poder de queimar a injustiça racial e a exploração socioeconômica.

No entanto, aqui estava este versículo assustador, que parecia promover a subordinação das mulheres. Jesus havia elevado as mulheres a uma condição igual a dos homens. Para mim, parecia que Paulo as havia empurrado de volta para baixo. Temia que este versículo arruinasse meu testemunho.

Uma Imagem de Cristo e a Igreja

Em minha frustração, tentei encontrar uma explicação alternativa para Efésios 5.22. No grego, a palavra traduzida por “submissão” aparece no versículo anterior como “sujeitando” — “sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo” (Ef 5.21) — portanto, tentei argumentar que o restante do texto aplicava a submissão tanto aos maridos quanto às esposas. Isto, porém, não se sustentava: os versículos seguintes estabelecem papéis distintos para os maridos e as esposas.

Então voltei minha atenção para a instrução aos maridos. “Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25). De que modo Cristo amou a Igreja? Morrendo na cruz; entregando-se, nu e sangrando, para sofrer por ela; colocando as necessidades dela acima das suas; dando tudo por ela.

Perguntei-me como me sentiria se essa fosse a instrução para as esposas: Mulheres, amem seu marido até o ponto da morte, colocando as necessidades dele acima das suas e se sacrificando por ele.

Se o Evangelho é verdadeiro, nenhum de nós se achega à mesa com direitos. A única maneira de nos aproximarmos é humildemente. Se quiser manter meu direito fundamental à autodeterminação, devo rejeitar a mensagem de Jesus, pois ele me conclama a me submeter completamente a ele: a negar-me a mim mesma, tomar minha cruz e segui-lo (Lc 9.23).

Então, a ficha caiu de vez. Esposas, submetam-se aos seus maridos como ao Senhor. Maridos, amem suas esposas como Cristo amou a Igreja. Este modelo não é, em última instância, a respeito de uma esposa e um marido específicos; é a respeito de Jesus e a Igreja. Deus criou o sexo e o casamento para nos dar um vislumbre de sua intimidade conosco.

Pelo fato de que nossos casamentos apontam para um casamento maior, os papéis não são intercambiáveis: Jesus se doa por nós; nós nos submetemos a ele.

Três Preocupações

Então, para minha surpresa, os três problemas que tive quando li pela primeira vez Efésios 5.22 foram solucionados. Agora, porém, tenho três preocupações sobre como o casamento complementarista é muitas vezes ensinado.

1. Tentativas de resumir

O casamento complementarista é frequentemente resumido como “As esposas se submetem, os maridos lideram”. Tal resumo, no entanto, não reflete os mandamentos bíblicos. As esposas de fato são conclamadas a se submeterem (Ef 5.22; Cl 3.18; 1 Pe 3.1). Mas o mandamento principal para os maridos é o amor (Ef 5.25, 28, 33; Cl 3.19), e os mandamentos adicionais ordenando empatia e honra (1 Pe 3.7). O mandamento para as esposas em Efésios certamente implica que os maridos devem liderar com o amor sacrificial de Cristo. Mas, se tivermos que resumir as Escrituras, “As esposas se submetem, os maridos amam” é um reflexo mais preciso do que elas querem dizer.

2. Tentativas de fundamentação psicológica

Na esperança de defender a bondade dos mandamentos de Deus, os cristãos às vezes tentam fundamentar o casamento complementarista na psicologia de gênero: as mulheres são seguidoras naturais, os homens são líderes naturais; os homens precisam de respeito, as mulheres precisam de amor; e assim por diante. Já ouvi a alegação de que as mulheres são naturalmente mais submissas, mas nunca ouvi ninguém argumentar que os homens são naturalmente mais amorosos.

Também ouvi pessoas argumentarem que recebemos estes mandamentos porque eles se dirigem àquilo no qual somos naturalmente ruins: as mulheres são boas em amar, os homens são bons em respeitar, portanto os mandamentos são invertidos. Dizer, porém, que a história humana nos ensina que os homens naturalmente respeitam as mulheres é enfiar a cabeça na areia com uma venda nos olhos e tampões no ouvido, para dizer o mínimo.

Na melhor das hipóteses, tais afirmações sobre gênero são generalizações, análogas à afirmação de que os homens são mais altos que as mulheres — embora muito menos verificáveis. Na pior das hipóteses, elas causam ofensa desnecessária a uma geração que já interpreta mal e deturpa o que a Bíblia diz sobre gênero. Elas também abrem espaço para exceções: se esses mandamentos são dados porque as esposas são naturalmente mais submissas, e eu acho que sou uma líder mais natural do que o meu marido, isso significa que podemos trocar de papel?

Se olharmos de perto, no entanto, veremos que tais afirmações não se encontram em lugar nenhum do texto. Efésios 5 fundamenta nossos papéis conjugais não na psicologia de gênero, mas na teologia centrada em Cristo.

3. Tentativas de justificar os papéis de gênero “tradicionais”

Efésios 5 é um irritante constante aos nossos ouvidos ocidentais no século XXI. Mas não devemos interpretá-lo como uma justificativa dos papéis de gênero “tradicionais”. O texto não diz que o marido é aquele cujas necessidades vêm em primeiro lugar e cujo conforto é primordial.

De fato, Efésios 5 é uma crítica devastadora aos papéis tradicionais de gênero, tanto em seu contexto original quanto no atual. No drama do casamento, as necessidades da esposa vêm em primeiro lugar e a vontade do marido de se priorizar é cortada com o machado do Evangelho.

Um Desafio

Minha maior preocupação, porém, quando ouço algum ensino sobre Efésios 5 é minha incapacidade de viver de acordo com isto. Sou casada há uma década e é um desafio diário lembrar-me daquilo a que sou chamada a ser, neste drama do Evangelho e perceber oportunidades para me submeter ao meu marido como ao Senhor. Submeter-me não porque eu seja naturalmente mais ou menos submissa, ou porque ele é naturalmente mais ou menos amoroso, mas porque Jesus se submeteu à cruz por mim.

Meu casamento não diz respeito primariamente a mim e ao meu marido da mesma maneira que Romeu e Julieta não diz respeito aos atores que interpretam estes papéis na peça. Meu casamento diz respeito a retratar a Jesus e sua Igreja.

Efésios 5.22 costumava me causar repulsa. Hoje me cativa e me atrai para Jesus: o verdadeiro marido que satisfaz nossas necessidades, o único homem que merece nossa submissão total.

Nota dos editores: Uma versão deste artigo apareceu pela primeira vez no blog da autora.

Traduzido por Abner Arrais.

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