×
Procurar

Tudo começou com uma conversa inocente, alguns minutos a mais de atenção e uma confiança imatura em um adulto confiável. Suas mensagens constantes e intencionais faziam com que ela se sentisse confortável, cuidada e especial.

Ele era um professor, e ela havia sido ensinada a confiar, ouvir e obedecer. Mas havia algo estranho dessa vez. Aos poucos ele começou a implorar em suas mensagens para que esse relacionamento especial fosse mantido em segredo. Ninguém deveria saber que eles estavam conversando—os sinais de problema eram implícitos. Depois de ter certeza de que havia conquistado sua confiança, ele iniciou o próximo segredo com estas palavras: “Me encontre neste corredor da escola”. Ela tinha apenas 13 anos.

Relatos de abuso sexual são difíceis e desconfortáveis de ler. Se você for como eu, essas histórias o fazem parar diante do horror. Seu estômago se revira. Seu coração acelera de raiva. Tentamos entender o que aconteceu ao rapidamente buscar culpados. Como algo assim foi permitido? Por que ela não disse algo antes? Como ninguém percebeu?

Ou podemos tender a desviar o assunto: É horrível essas coisas terem acontecido com ela. Seus pais provavelmente não estavam atentos. Isso nunca acontecerá com meu filho. Não na minha família. Não na minha igreja. Eu perceberia imediatamente. Nunca deixaria de enxergar os sinais.

Ou então negamos: Isso não pode ter realmente acontecido. Ela está inventando para chamar atenção. Ela provocou isso com seu comportamento e atitude.

Mas nossa fuga do assunto não significa que o abuso sexual não tenha acontecido ou que não esteja acontecendo com indivíduos em nossa família, igreja ou comunidade. Primeiro, precisamos entender o que é o abuso sexual e por que é importante abordá-lo. Depois, para cuidar bem das vítimas de abuso sexual, precisamos ter algumas conversas importantes. Por fim, devemos considerar qual mensagem estamos comunicando ao mundo.

O Que é Abuso Sexual Infantil?

A Mayo Clinic [Clínica Mayo] define abuso sexual infantil como “qualquer atividade sexual com uma criança”. A Rede Nacional de Estresse Traumático de Crianças vai além, expandindo a definição para “qualquer interação entre uma criança e um adulto (ou outra criança) na qual a criança é usada para a gratificação sexual do perpetrador ou do observador”. O abuso sexual infantil não se limita ao contato físico, mas inclui comportamentos como voyeurismo, exibicionismo ou expor uma criança à pornografia.

É importante enfatizar que as crianças não têm a capacidade legal de consentir em qualquer tipo de interação sexual. Embora a idade de consentimento varie entre os estados, o consenso nacional nos Estados Unidos é que qualquer interação sexual com uma criança menor de 16 anos é considerada estupro de vulnerável.

Além da diferença de idade, muitas vezes há uma diferença de poder. Na maioria das vezes, os abusadores sexuais estão em posições de autoridade sobre as crianças e são conhecidos por elas e por suas famílias. De fato, 80% dos abusadores são conhecidos pelas crianças.

O Abuso Infantil Precisa ser Exposto

A instrução para se encontrar no corredor da escola não caiu bem para ela. Ela queria ser obediente, mas aquilo parecia estranho, então compartilhou a informação com sua amiga mais próxima.

Sua amiga ficou chocada com o convite e imediatamente contou à sua própria mãe sobre a situação estranha. A mãe relatou o caso às autoridades escolares.

Assim como fez essa mãe, qualquer membro do corpo de Cristo—indivíduos, pais, professores em escolas cristãs e líderes da igreja—deve relatar qualquer suspeita de abuso sexual ou qualquer comportamento que possa se enquadrar na categoria de aliciamento sexual.

Quando isso acontece, escolas cristãs, igrejas e ministérios infantis precisam ter planos de ação que possam ser implementados, incluindo protocolos adequados para relatar qualquer suspeita de abuso sexual. Isso pode consistir em notificar diretamente o diretor do ministério infantil, o pastor titular e o órgão responsável pelo bem-estar infantil em sua comunidade.

Os ministérios cristãos devem garantir a segurança da criança (e a segurança de outras crianças) removendo o adulto suspeito até que as alegações sejam devidamente investigadas.

Isso pode parecer uma tarefa muito complicada, mas o “Evangelical Council for Abuse Prevention” [Conselho Evangélico para Prevenção de Abuso] desenvolveu diretrizes e padrões que podem orientar sua igreja nesse processo.

Efésios nos diz: “não participem das obras infrutíferas das trevas; antes, exponham-nas à luz” (Ef 5.11, NVI). Poucos versículos antes, Paulo explica o que são essas obras infrutíferas das trevas: imoralidade sexual, qualquer tipo de impureza, ganância, obscenidade, conversas tolas ou gracejos imorais (vv. 3–4). O abuso infantil pode se enquadrar em todas essas categorias. Os homens e mulheres que caminham nesse pecado precisam ser identificados e seu pecado exposto.

Precisamos ter Conversas Importantes

Nesse ponto da história, o plano de ação começou a falhar. Devido à falta de treinamento, nem a escola nem a igreja souberam como responder. Primeiro, chamaram o professor para explicar a situação, e ele rapidamente manipulou os detalhes a seu favor. O próximo a ser chamado foi o pai da menina, que foi informado do comportamento inapropriado de sua filha em relação ao professor.

Ambas essas conversas foram erros. Pais, pastores, presbíteros, diretores de ministério infantil e outros funcionários da igreja não são especialistas em abuso sexual. Suas tentativas de reunir informações sobre as alegações de abuso sexual por conta própria e determinar se essas alegações são verdadeiras ou falsas são prejudiciais à criança, à família e à capacidade dos especialistas de conduzirem uma investigação criminal posteriormente.

Pense desta forma: se um membro da igreja sofre um assalto em sua casa, os pastores, presbíteros ou funcionários da igreja não são chamados para investigar se o roubo realmente aconteceu ou quem é o responsável. Nesses casos, o membro da igreja é aconselhado a chamar a polícia e seguir suas recomendações, enquanto outros membros oferecem apoio, orações, refeições e lembretes da fidelidade de Deus. Assim deve ser com os casos de abuso sexual.

Qualquer investigação de uma alegação de abuso sexual deve ser confiada às autoridades (Rm 13.1–6) e àqueles que têm treinamento profissional em lidar com esses assuntos.

Existem maneiras de conduzir avaliações forenses em casos de abuso sexual que impedem que a criança reconte sua experiência de abuso para que ela não seja traumatizada novamente. Normalmente, equipes compostas por assistentes sociais, profissionais de saúde, investigadores policiais e entrevistadores forenses são usadas para fazer perguntas adequadas às crianças. Eles coletam informações sobre o abuso, identificam os serviços apropriados e garantem que a criança seja fisicamente cuidada.

O trabalho da igreja não termina quando o abuso sexual infantil é relatado às autoridades. Na realidade, o trabalho começa aí. Logo após Jesus dizer aos discípulos para protegerem e cuidarem das crianças (Mt 18.1–6), ele os adverte sobre o terrível poder do pecado não confrontado (vv. 7–9). Em seguida, ele lhes dá uma maneira de confrontar o pecado uns nos outros (vv. 15–19).

Enquanto o estado cuida das realidades físicas, a igreja deve responder às realidades espirituais ainda mais sérias. Se o abusador for um crente, seu pecado precisa ser confrontado. E cuidar fisicamente, emocionalmente e espiritualmente das vítimas e de suas famílias exige um compromisso a longo prazo de amar e caminhar ao lado delas, confiando no poder do evangelho para redimir, curar e trazer justiça.

O Mundo Está Observando Nossa Resposta ao Abuso Infantil

Desde o momento em que a má conduta do professor e seu pecado foram expostos, a vida da jovem começou a desmoronar. Em poucos dias, ela foi expulsa da escola, toda a membresia da igreja foi informada da situação e ela foi rotulada como uma criança sexualizada. Enquanto isso, a reputação do professor foi protegida, sua posição no ministério foi mantida e sua família foi vista como vítima e cercada de apoio.

Até hoje, ela carrega as cicatrizes desse incidente. Ela não acredita mais na bondade ou na justiça de Deus e não consegue entender por que Deus permitiria que sua igreja agisse dessa maneira. Se o corpo de Cristo é tão descuidado no modo como lida com o abuso sexual infantil, ela não quer ter nada a ver com ele.

Irmãos e irmãs, há muito tempo negligenciamos esse pecado que se esconde nas sombras. Crianças em nossas igrejas e comunidades são vítimas desse pecado horrendo e detestável, e elas precisam saber que os adultos ao seu redor estão dispostos a ouvi-las e protegê-las.

O mundo está observando como respondemos a essa questão. Mais do que isso, Jesus Cristo ordenou que sua igreja fosse luz para o mundo, e um dia cada adulto, pai, presbítero, pastor e igreja prestará contas a ele sobre como cuidamos desses pequeninos (Mt 25:40–45). Estejamos atentos a este encorajamento e advertência.

Eu oro para que sejamos instrumentos nas mãos do Senhor para cuidar das muitas crianças que sofreram os horrores do abuso sexual, cujas vozes não foram ouvidas e cujas dores foram ignoradas. Oro para que nosso coração esteja sensível a estas questões e que nos tornemos uma igreja preparada para responder rapidamente, bem e com amor a qualquer abuso sexual revelado.

Oro para que o corpo de Cristo, sua igreja, se torne o lugar mais seguro para as crianças que foram sexualmente abusadas a correrem e experimentarem o poder libertador, redentivo e renovador do evangelho de Jesus Cristo.

Traduzido por Rebeca Falavinha.

 

CARREGAR MAIS
Loading