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Atenção aos Detalhes

Durante os últimos meses tenho investido no estudo, preparação e exposição do texto de 1João na Igreja Batista Fonte São Paulo. A razão de ensinar esse livro em particular está diretamente ligado ao convite que João faz aos seus leitores para que vivam o cristianismo de modo convicto. Em poucas e duras palavras, João pastoreia sua comunidade os exortando a viver o evangelho de modo confiante em meio aos muitos ataques que cercam a comunidade cristã. E, considerando que vivemos uma época de erosão e fluidez das convicções, acredito que a mensagem do apóstolo é extremamente pertinente para nossa igreja nos dias de hoje. Afinal, nós também precisamos aprender a viver nosso cristianismo de modo convicto.

Um Texto Difícil de Interpretar

Entretanto, apesar do texto de 1João ser frequentemente classificado entre os mais simples do Novo Testamento [1], o apóstolo constrói frases, expressões que por falta de especificidade acabam gerando grande debate entre os comentaristas sobre qual seria o sentido intencionado pelo autor [2]. Soma-se a isso, o fato de que informações específicas sobre o pano de fundo histórico e o contexto dos leitores originais é deveras escasso [3], o que acaba por permitir que comentaristas apresentem sugestões (em alguns casos bem imaginativas) para tentar reconstruir as condições originais da escrita da carta.

Um Texto Difícil de Ensinar

Em outras palavras, diferente do que normalmente se pensa, ensinar em 1João não é tão simples quanto parece. É necessário que o pastor/professor esteja atento a detalhes que podem fazer grande diferença no modo em que se expõe o texto para sua comunidade. Para o pastor/professor que prioriza o texto no idioma original, essa atenção aos detalhes é fundamentalmente necessária, pois em alguns casos, a interpretação do texto pode levar a conclusões completamente diferente e em alguns casos até mesmo divergentes do mesmo texto [4]. E é exatamente aqui que gostaria de demonstrar a suprema importância da atenção a detalhes do texto.

Um Caso Interessante

Durante meu processo de preparação para as mensagens em 1João, costumeiramente usei a versão impressa do texto da vigésima sétima edição do texto grego da Nestlè-Aland (NA27), enquanto usava a versão digital da vigésima oitava edição (NA28) para comparar a diferença no texto, no aparato crítico e no modo como os parágrafos eram apresentados nas diferentes edições do texto. Como estava de mudança e meus livros não estavam disponíveis em todo o tempo, por um período usei apenas o texto digital da NA28 como texto base para as mensagens.

Ao chegar no texto 1 João 3:18-24 me deparei com um texto difícil de traduzir, difícil de interpretar e difícil de dividir. Confesso que tive dificuldades para traduzir o texto e tentar que o mesmo fizesse sentido em português. As sentenças de João são curtas, as frases são longas, não são claras e apresentam uma rápida mudança de temas em um curto espaço [5]. Muito embora as dificuldades gramaticais e exegética sejam muitas nesses versos [6], o que me chamou mais a atenção foi a estranha divisão de parágrafos proposta pelo comitê editor da NA28, em especial a edição digital do mesmo texto.

A Importância dos Parágrafos

Parágrafos são unidades textuais compostas por frases, períodos e/ou orações que detalham, expõe e ampliam uma ideia por meio da explicação de suas partes. É uma importante divisão de um texto, no qual a retórica do autor é parcialmente expressa e manifesta suas conexões com os parágrafos anteriores e posteriores em uma progressão do discurso proposto pelo autor. Como o texto, parágrafos tem sua própria estrutura, como por exemplo uma introdução, um desenvolvimento e eventualmente uma conclusão parcial que abre as portas para uma nova sequência de ideias em um novo parágrafo. Em outras palavras, parágrafos são extremamente importantes para o texto, pois por meio da composição sequencial de ideias organizadas em parágrafos o autor compõe, expõe, explica suas ideias.

É por isso que livros de hermenêutica e homilética sugerem que o intérprete/pregador esteja atento aos parágrafos, afinal, a mensagem do autor está diretamente relacionada a sua organização de ideias por meio de parágrafos, “porque cada parágrafo, seção ou subseção da Escritura contém uma ideia, de modo que nós não entenderemos uma passagem até que tenhamos entendido exatamente seu tema e suas ideias complementares” (Haddon W. Robinson, Biblical Preaching : The Development and Delivery of Expository Messages, 2nd ed. (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2001), 42). No seu livro Toward an Exegetical Theology, Walter Kaiser, falando sobre a importância do parágrafo para a pregação afirma:

No coração da exegese deve haver uma análise sintática detalhada que envolve a identificação: (1) da proposição do tema; (2) da relação de todas as frases, cláusulas e orações do parágrafo para a proposição do tema; e (3) a conexão do parágrafo com outros parágrafos. Sem essa análise, os resultados da exegese serão infrutíferos nos ouvidos da congregação (Walter C. Kaiser, Toward an Exegetical Theology: Biblical Exegesis for Preaching and Teaching, paperback ed. (Grand Rapids, Mich.: Baker Books, 1998), 104).

Entretanto, o que poucas pessoas sabem é que parágrafos tal como os entendemos não faziam parte do modo de escrita dos livros antigos. Digno de nota é que nem mesmo nossas divisões de capítulos eram conhecidas nos antigos manuscritos do NT [7], muito menos a versificação desses capítulos [8]. Muito embora existem vestígios históricos de como o texto deveria ser entendido na tradição manuscrita do NT [9], a verdade é que os parágrafos tal como os conhecemos em nossas edições contemporâneas não existiam no texto original.

Em outras palavras, os parágrafos, divisões, versificações são tentativas editoriais de dividir o texto para facilitar sua interpretação. Via de regra, os editores do texto grego nos prestam um excelente serviço quando dividem o texto em parágrafos, pois é a partir dessa divisão que as traduções modernas são produzidas e a partir delas que dividimos o texto para realizar nossa exposição.

Como era de se esperar, a divisão das mensagens da série em 1João que preguei nos últimos meses, seguia de perto a divisão de parágrafos proposta pela NA27, o texto impresso que usava para realizar a exegese inicial. Muito embora em alguns casos entendia que a divisão poderia ser melhor, em nenhum caso encontrei tamanha dificuldade como no caso  de 1João 3:19ss. Foi então que resolvi recorrer a outras edições do texto grego e entender como poderia fazer entender melhor o parágrafo que me preparava para pregar.

Diferenças na Divisão de Parágrafos

Os editores do texto majoritário Maurice Robinson e William Pierpoint (RP2005) optaram por divisões normalmente maiores em 1João (ver imagem), quando comparado com as versões críticas. No texto de 1João 3 em particular, os editores entendem que o parágrafo em questão teria início no verso 13 e se estenderia até o verso 24. Dentre todas as edições comparadas esse é o maior parágrafo sugerido. Talvez pela dificuldade de se entender como os diferente temas e afirmações de João se relacionem aqui, os editores tomaram uma atitude mais conservadora e deixaram nas mãos dos pastores/professores a decisão de entender a divisão do texto. Em outras palavras, tal divisão implicaria em uma nova proposta de pregação do texto, e faria certa diferença no modo como a exposição seria apresentada para a comunidade.

Por outro lado os editores da NA27, além de demarcarem parágrafos atribuem um espaçamento diferenciado nas edições impressas em sentenças que entendem que poderiam iniciar novos parágrafos. Trata-se de uma pausa textual maior do que um ponto final, mas não grande o suficiente para se entender como um novo parágrafo. Por exemplo, no parágrafo 2:7-11, os editores entendem que o início do verso 9 poderia ser entendido como uma pausa alongada, distinguindo-o de um ponto final típico, e de um novo parágrafo. O mesmo acontece no parágrafo 2:22-25, no qual os editores entendem que o verso 24 poderia ter uma pausa alongada na leitura do texto, mas não necessariamente um novo parágrafo.Tendo considerado isso, no texto em questão, a saber 1João 3, os editores entenderam que o verso 19 abriria um novo parágrafo, entretanto, entendiam que o verso 18 pudesse ser uma pausa alongada. Em outras palavras, a divisão proposta pela NA27 sugere que o assunto apresentado a partir do verso 19, embora relacionado com os versos anteriores, marcava uma progressão e a indicação de que a expressão [καὶ] ἐν τούτῳ (e nisto) fariam referência ao conteúdo a ser apresentado e não àquilo que tinha sido acabado de dizer. Essa divisão, além de estranha no contexto, dificulta a leitura de um texto truncado como os versos 19-20. A proposta de uma pausa alongada no verso 18 seguida de um novo parágrafo no verso 19 certamente não auxilia a exegese do texto. Nesse sentido, o paragrafo estendido proposto por na RP2005 seria preferível, ainda que não louvável.

Já a NA28 conseguiu oferecer nesse texto ao mesmo tempo uma frustração e uma surpresa editorial. A frustração é que os parágrafos da NA28 impressa seguem idênticos aos da NA27. Pouco esforço editorial foi demonstrado na tentativa de melhorar apresentar o texto. A única melhoria na NA28 foi a remoção da pausa alongada do verso 18, favorecendo a indicação de que o verso 19 de fato inicia um novo parágrafo. A razão para tal alteração é a “confirmação” da variante textual [καὶ] (NA27) no início do verso 19. Uma vez que καὶ deixa de ser entendido como suspeito, e passa a ser incorporado no texto, a pausa alongada no verso 18 deixa de ser uma opção para um novo parágrafo (visto que se relaciona clara e conceitualmente com v.17). A melhoria editorial é interessante, porém ainda insatisfatória, na minha opinião.

Por outro lado, o comitê editorial cometeu uma gafe considerável na reprodução do texto da NA28 impressa: ao invés de inserir usar um ponto final no verso 18 e então fazer do verso 19 um novo parágrafo, a NA28 equivocadamente usou uma vírgula. Em outras palavras, a edição crítica mais prestigiada do NTGrego confundiu um ponto final com uma vírgula. Na era da produção eletrônica de textos, de edições e revisões, um simples ponto final foi confundido com uma vírgula.

Agora, mais surpreendente foi perceber que existia uma diferença entre a NA28 impressa e sua versão digital. Enquanto a NA28 impressa seguia as divisões de parágrafos da NA27, a NA28 digital (tanto no Logos como no Accordance) alteraram dois elementos do texto impresso: (1) substituíram a vírgula pelo correto uso do ponto final; (2) substituíram o parágrafo do início do verso 19 para meio do verso. Ou seja, ao invés de iniciar com a expressão καὶ ἐν τούτῳ como a NA28 impressa (v.19a), a NA28 digital entendeu que καὶ ἔμπροσθεν (e diante dele) deveria marcar o início do novo parágrafo (v.19b). Nessa divisão, καὶ ἐν τούτῳ (v.19a) certamente faria referência ao que precede o texto e não ao que segue. Essa seria provavelmente a única vantagem dessa divisão, visto que parece difícil justificar καὶ ἔμπροσθεν como início de um novo parágrafo. Ainda mais interessante é que somente a versão digital da NA28 do BibleWorks é que “copiou” fielmente o texto da NA28 impressa. Ou seja, das três edições digitais da NA28 consultadas, as duas mais prestigiadas versões corromperam o texto escrito com uma divisão suspeita de parágrafo. Em outras palavras, prestígio e fidelidade transcricional nem sempre andam de mãos dadas.

De todas as edições comparadas, a SBL é a edição que melhor parece representar a divisão do texto. Ainda que existam subdivisões conceituais no texto (cf. NA28: vv.19-22; 23-24), Michael Holmes o editor da SBL, de modo consistente preferiu iniciar um novo com a expressão Τεκνία (filhinhos) no verso 18. Nesse caso, a expressão ἐν τούτῳ γνωσόμεθα (v.19; E nisto saberemos) faria referência ao conteúdo do verso 18, favorecendo uma possibilidade hermenêutica simples e consistente com 1João. Essa divisão de parágrafos reflete a decisão editorial de iniciar novos parágrafos quando o autor se dirige aos seus leitores de modo afetuoso, como Holmes o faz em 2:1 (Τεκνία- filhinhos), 2:7 (Ἀγαπητοί- amados), 2:12 (τεκνία- filhinhos), 2:18 (Παιδία- filhinhos), 2:28 (τεκνία- filhinhos); 4:1 (Ἀγαπητοί- amados), 4:7 (Ἀγαπητοί- amados), 5:21 (Τεκνία- filhinhos). É verdade que em casos mais claros, Holmes inicia um parágrafo com Καὶ ἐν τούτῳ (e nisto; SBL 2:3; 4:13), mas esse uso é raro em sua edição. Normalmente, Holmes entende que essa expressão é entendida como parte de um parágrafo já iniciado (cf. SBL 3:4, 5*2; 3:10, 16, 24; 4:2, 9, 10, 17, 5:2). Vale mencionar que existem ocasiões em que declarações afetuosas não marcam novos parágrafos (cf.SBL 3:2; 21, 4:11), mas que as mesmas estão claramente inseridas dentro dos parágrafos já iniciados.

De acordo com Holmes, o parágrafo em questão tem seu início no verso 18, e não no verso 19 como sugerem as diferentes edições da NA. Também evita um parágrafo por demais alongado da RP2005 e oferece uma opção que parece consistente com o fluxo do texto. Em outras palavras, a revisão proposta por Holmes no texto da SBL reflete uma melhoria no entendimento, interpretação e apresentação do texto. Esse entendimento é também refletido no texto grego da Tyndale House.

Implicações das Diferentes Divisões de Parágrafos

A Proposta do Texto Majoritário:

Como já demonstramos acima, a pregação expositiva é de certo modo dependente da divisão de parágrafos apresentada nas edições do texto na sua língua original. Aqueles que optarem por usar a divisão do texto majoritário proposta na RP2005, além de um texto distinto terão a disposição uma divisão distinta de conteúdo. Nesse caso, o texto poderia ser exposto do seguinte modo (se a divisão de parágrafos fosse tomada com indicativo de perícopes a serem expostas):

(1) O Ódio do mundo (vv.13-15);

(a) Contra os discípulos (v.13);

(b) Como marca da morte (v.14);

(c) Como assassinado (v.15);

(2) O Amor Cristão (vv.15-21);

(a) O Exemplo de Cristo (v.16);

(b) Um Exemplo Cristão (v.17);

(c) O princípio (vv.18-21)

(3) As Certezas da Vida Cristã (vv.22-24)

(a) Certeza da Oração (vv.21-22)

(b) A tríade da convicção: Fé, Amor e Obediência (vv.23-24a)

(c) O Testemunho do Espírito

Numa exposição como essa, a ênfase poderia ser colocada sobre nossa resposta de amor ao ódio do mundo e como tal postura nos beneficia com uma convicção inabalável diante de Deus de que somos de fato da verdade (ie. Somos de Deus, pertencemos a Deus, andamos na luz, etc). A exortação poderia enfatizar a imitação de Cristo no amor e na tranquilidade do coração baseado no testemunho do Espírito Santo.

A Proposta do Texto NA28 Impressa:

Por outro lado, a divisão de parágrafos da NA28 impressa permitiria que o texto acima dividido fosse apresentado em diferentes mensagens, como aconteceu com a minha exposição. Em outras palavras, optei por pregar 1João 3:11-18 em uma mensagem e 3:19-24 em outra. Muito embora minha consciência me acusasse contra a inclusão do verso 18 na primeira mensagem, e como a segunda porção do texto foi apenas usada na última mensagem da série, optei por usar a expressão καὶ ἐν τούτῳ γνωσόμεθα (e nisto sabemos) como uma oportunidade de rever alguns conceitos já apresentados na carta. Diante disso, a mensagem no texto de 1João 3:19-24 foi dividida do seguinte modo:

(1) O Princípio da Convicção (v.19a)

(a) Fé (5:13; 2:22-23; 2:6)

(b) Amor (4:7; 3:16-17; 4:12)

(c) Obediência (2:3-4; 2:7, 3:11; 3:7)

(2) Como Lidar com o Problema da Condenação (vv.19-24)

(a) Entender a Natureza da Condenação (v.20a)

(b) Entender a Natureza da Convicção (vv.23-24)

(c) Entender a Natureza da Confiança (v.20b)

(3) A Proposta da Confiança (v. 21)

Nessa mensagem a ênfase foi colocada sobre a necessidade de se entender o que João quer dizer com convicções e como o cristão pode a partir delas lidar com o problema da condenação do coração. A exortação foi direcionada para a necessidade de uma vida reta diante de Deus e da dependência do testemunho subjetivo do Espirito Santo.

Como fica evidente, com diferentes divisões de parágrafos, diferentes propostas homilética são oferecidas, e com isso diferente ênfases e exortações são ministradas para a congregação. Ambas as mensagens carregam a autoridade de um texto inspirado, de uma exegese zelosa, mas que devido a diferentes divisões textuais acaba por apresentar ênfases distintas.

A Proposta da SBL:

Diante da pequena diferença de parágrafo apresentada pela edição de Michael Holmes, acredito que a mensagem acima delineada poderia melhor representar o texto e a ênfase de João. Iniciando um novo parágrafo no verso 18, e o usando como o ponto de partida para a preparação da homilia, ao invés de lidar com o conceito da convicção de modo geral, como fiz de modo quase temático na mensagem que delineei acima, a expressão καὶ ἐν τούτῳ γνωσόμεθα (e nisto conhecemos) do verso 19 seria a conclusão do pensamento exposto no verso 18. Ou seja, João estaria enfatizando que a manifestação genuína do amor é o modo pelo qual reconhecemos que somos da verdade. Nessa divisão textual, uma possível apresentação homilética poderia ser assim expressa:

(1) A Importância do Amor (vv.18-20)

(a) Expressão da Verdade (v.18)

(b) Expressão da Confiança (v.19)

(c) Expressão da Dependência (v.20)

(2) A Importância da Confiança (vv.21-22)

(a) Consciência Tranquila (v.21a)

(b) Relacionamento Íntimo (v.21b)

(c) Oração Respondida (v.22)

(3) A Importância da Convicção (vv.23-24)

(a) Fé como obediência (V.23a)

(b) Amor como obediência (v.23b)

(c) Obediência como evidência da Fé (v.24a)

(d) Convicção Sobrenatural (v.24b)

Nessa mensagem a ênfase seria colocada sobre a importância de uma vida centrada no amor altruísta na comunidade cristã e de como essa manifestação do amor divino influencia a convicção e comportamento cristão. A exortação enfatizaria a necessidade de uma percepção mais adequada da fé em relação a obediência e o amor e como tal percepção influenciaria o comportamento cristão.

Conclusão

Como fica evidente, a prática da pregação expositiva é um grande desafio, especialmente quando pensamos na influência que pequenas diferenças textuais podem fazer no modo como o texto é apresentado, e nas diferenças de ênfase e exortação que cada uma delas pode oferecer ao texto. Isso sem contar com a perspectiva pessoal do exegeta/pastor que poderia diante do mesmo parágrafo oferecer percepções e apresentações completamente distintas daquelas apresentadas acima.

Esse breve estudo comparativo de divisões de parágrafos em 1João, embora aparentemente simples, apresenta alguns princípios que precisamos manter em mente a medida que nos preparamos para apresentar o texto para nossas comunidades:

1. Todas as cópias, mesmo as digitais, são passíveis de erro

Não importa quão academicamente preparado um comitê editorial é, e não importa quanto tempo se passe no processo de edição de um texto, o mesmo não será isento de falhas. No caso da edição digital da NA28, somente a versão do BibleWorks representa fielmente o texto da versão impressa no parágrafo em questão. As versões do Logos e Accordance inseriram uma estranha variante na divisão de parágrafos que não corresponde ao texto impresso da NA28. Ainda que as cópias sejam digitais, que o copiar e colar seja tecnicamente isento de erros, o elemento humano ainda existe e pode alterar o texto, fazendo com que o mesmo seja lido e entendido de diferentes formas.

E foi exatamente isso que aconteceu comigo enquanto traduzia o texto em questão. Na ocasião tinha em mãos a NA27 impressa e a NA28 digital, e vendo a diferença entre elas, entendia que deveria seguir a versão digital, por ser mais recente e por isso sugerir uma leitura melhorada do texto. Somente depois de tentar entender como essa divisão de parágrafos poderia fazer sentido (se é que fazia algum) é que resolvi procurar entre meus livros a versão impressa da NA28, pois não acreditava que aquela divisão fosse possível. Ao notar que a NA28 impressa seguia a NA27, comecei a considerar a possibilidade de uma “atualização” do texto digital, mas permanecia insatisfeito com a opção oferecida na versão digital. Foi então que entendi muito provavelmente tratava-se de um erro da edição digital, e não de uma proposta editorial. Em outras palavras, nem mesmo textos digitais, copiados digitalmente são isentos de erros humanos (ou de código). Se o problema foi humano, alguém substituiu a vírgula da versão impressa por um ponto final (no verso 18), e inadvertidamente capitalizou o segundo καιdo verso 19, ao invés do primeiro. Com isso, esse revisor criou uma proposta alternativa infeliz de leitura do texto. Se o problema foi de código, o texto base das versões do Logos e Accordance foram sutilmente corrompidas e pequenas alterações como essa passaram despercebidas pelos revisores. Seja como for, algum estagiário pisou na bola!

2. Diferencie o texto crítico do texto original

Muito embora as diferenças entre edições críticas do texto não sejam tão significativas, cada editor ou um comitê editorial irá propor alterações na apresentação do texto, seja na sua forma textual, seja na sua divisão. Como fica claro na tabela comparativa das versões usadas nesse post (ver aqui), a divisão de parágrafos da RP2005 é a mais particular, muito embora, somente a NA27 e NA28 impressas sejam idênticas. A SBL, embora seja um texto crítico produzido sob os mesmos princípios da NA, apresentou um texto distinto tanto em forma texto como na divisão de parágrafos.

O que eu quero dizer com isso é que devemos ter bastante critério no uso de versões editoriais e cuidado para não confundir o texto impresso por um determinado comitê ou editor como o texto original. Quando lemos o NA28, UBS5, SBL ou qualquer outra edição crítica do texto do NT, nós estamos lendo o resultado de um longo processo de trabalho de críticos textuais, que apesar de serem especialistas na área, não são infalíveis. Eles fazem um trabalho detalhadamente intenso e tedioso para a maioria de nós, mas nos servem com a melhor opção de forma textual que eles são capazes de produzir. Entretanto, isso não significa que o fazem sem qualquer equívoco.

Por isso, desenvolva o hábito de ler, estudar e expor o texto dessas edições com os olhos em múltiplas traduções, afinal, as diferenças percebidas entre a forma do texto e sua divisão, podem ser significativas para a exposição do texto. Mantenha também em mente que a forma e a divisão do texto proposto pelas edições críticas são sugestões não imperativas de como o texto deve ser lido ou apresentado. Mantenha um diálogo com os editores durante seu estudo, entenda a forma e a divisão textual como um comentário dos editores ao texto original.

3. Fidelidade nem sempre produz os mesmos resultados

A fidelidade a Deus na exposição das escrituras nem sempre produz os mesmos frutos. Como ficou claro acima, dependendo do texto grego base e das divisões de parágrafo oferecidas por ele, o pastor-exegeta tem a disposição diferentes maneiras de identificar a estrutura e a proposta do texto e a partir disso oferecer diferentes aplicações para o texto. Em outras palavras, diferentes pastores, usando diferentes textos com diferentes divisões manifestarão sua fidelidade a Deus honrando o que entendem ser o melhor entendimento do texto. O resultado dessa fidelidade não será a reprodução exata de apenas um sentido possível para o texto, de uma possível estrutura para o texto, de uma possível estrutura para a mensagem, mas na diversidade de abordagens do texto. E essa diversidade de abordagens sugere que a fidelidade não acontece na tentativa de reprodução do texto, mas na reflexão do mesmo. Sendo assim, mais vale um pastor que investe tempo na reflexão do texto, do que muitos que apenas o repetem. Fidelidade, reflexão e diversidade andam de mãos dadas na exposição da escritura.

4. Atenção aos detalhes

Grande parte do que comentei nesse post passaria despercebido para muitos, visto que a maioria de nós usa versões eletrônicas do texto, que apresentam o texto verso por verso. Nesse modo de ler o texto, a análise do mesmo fica restrita aos elementos presentes no verso observado e pouca atenção se dá ao discurso do autor.

Por outro lado, observar esses detalhes pode enriquecer e muito o estudo e a exposição do texto. Como ficou evidente, as diferentes propostas de parágrafos oferecem alternativas distintas de interpretação e apresentação do mesmo. E cabe ao pastor-exegeta afiar suas ferramentas de leitura do texto grego para poder lidar com as diferenças apresentadas acima.

Também ficou evidente como pequenas diferenças podem resultar em grandes diferenças. No caso entre as diferenças de parágrafo entre a versão digital e impressa da NA28, ficou claro que a divisão da primeira estava equivocada enquanto a da segunda era somente ruim para o bom entendimento do texto. No caso da RP2005, embora melhor dividida que a NA28, a divisão de parágrafos poderia ter sido melhor dividida. Diante dos muitos temas introduzidos por João num curto espaço de texto, me parece que diferentes mensagens poderiam ser pregadas nessa divisão. Já no caso do texto da SBL, a melhor divisão de parágrafos favorece tanto a interpretação como exposição do texto no caso de 1João 3:18-24. Uma pena que não tinha visto isso antes, caso tivesse, teria usado essa divisão de parágrafos nas mensagens que preguei.

É verdade que grande parte (se não tudo) do que foi dito aqui nunca será repetido no púlpito (e nem deveria). Mas, essas observações e estudos farão muitos diferença no modo como o pastor ou professor entende, interpreta, usa e apresenta o texto. Em outras palavras, a atenção a detalhes é fundamental para uma boa exegese pública do texto.

 

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NOTAS

[1] Livros de introdução ao Grego do Novo Testamento usam frequentemente exemplos extraídos da literatura joanina, especialmente nos estágios mais iniciais do curso. Para aqueles que gostaria de ver uma sugestão de como organizar os textos do NTG do mais simples ao mais complexo, considere a sugestão de Daniel Wallace: https://danielbwallace.com/2013/12/29/reading-through-the-greek-new-testament/. Nessa lista o evangelho de João precede as cartas como os livros de menor complexidade léxica e sintática.

[2] Um dos casos mais conhecidos desse tipo de ambiguidade encontra-se na simples expressão (e suas variações) ἡ ἀγάπη τοῦ θεοῦ(o amor de Deus). Sendo usado cerca de 7x em 1João (cf. 2:5; 15; 3:17; 4:7; 9, 12; 5:3), a expressão dificilmente é usada com consistência e eventualmente pode ser usado com sentidos completamente diferente. Embora sejam duas  as opções mais conhecidas para se entender a expressão, a saber, ἡ ἀγάπη τοῦ θεοῦ pode significar nosso amor a Deus (genitivo objetivo) ou o amor de Deus por nós (genitivo subjetivo), Raymond Brown identifica 5 diferentes possíveis significados: (1) Amor humano a Deus [Genitivo Objetivo]; (2) O amor de Deus por nós [Genitivo Subjetivo]; (3) As duas ideias ao mesmo tempo [Genitivo Plenário]; (4) descrição do tipo do amor, um amor divino [Genitivo Qualitativo]; (5) Traduzir como “Amor de Deus” mantendo a ambiguidade e deixando a decisão para o leitor. De modo interessante, e reconhecendo a complexidade hermenêutica, Brown opta por usar a opção (5) na sua tradução, e explica sua preferencia entre (1) e (2) a medida que o contexto permite distinguir com algum grau de objetividade.

[3] A diferença de identificação de contexto histórico, faz toda diferença na interpretação. No caso de 1João parece consenso entre os comentaristas que 1João foi escrita em função de falsos mestres/profetas que haviam saído da comunidade a quem ele escreve. Comumente identifica-se os opositores apresentados em 1João com os gnósticos, uma seita que usava os elementos místico das religiões de mistério helênicas com uma visão baixa do AT e reinterpretavam a doutrina cristã pelo prisma do dualismo da filosofia pagã. Embora existam boas razões para se pensar que eram os agnósticos os falsos mestres atacados em 1João, tal opção gera alguns conflitos com a datação e autoria do texto, afinal, recentemente a academia parece estar convicta de que o gnosticismo como ideologia religiosa só passou a existir no segundo século. Se 1João foi escrita como uma reação à influência do gnosticismo, João não poderia ser o autor do documento. Por isso, alguns comentaristas tentam corrigir sua visão por apontar outros movimentos similares e mais antigos, como o cerentismo ou algum grupo indefinido chamado proto-gnósticos, um grupo com ideologia similares aos gnósticos, mas que teriam existido antes deles. Além disso, existem questões a respeito de que tipo de comunidade recebeu essa carta. Alguns entendem que era um tipo de comunidade hermética no estilo essênio, enquanto outros entendem com uma pequena comunidade apostólica. Seja qual for a opção, a interpretação do texto é deveras distinta.

[4] Um exemplo interessante é como comentaristas entenderam a constante exortação de 1João a respeito do amor aos irmãos. Rudolf Bultmann, por exemplo, entendeu que o termo “irmão” deveria ser entendido como uma referência a “humanidade”. Em outras palavras, por entender que o cristianismo reflete duas preocupações essenciais, o amor a Deus e a fraternidade entre os homens, Bultmann apresentou o “amor uns aos outros” como uma responsabilidade de amor fraterno entre seres humanos. Por outro lado, Raymond Brown, por entender que o autor é um membro da academia Joanina, herdeiros do ensino do apóstolo, e escreviam para a comunidade exclusivista, Brown entende que o amor mútuo apresentado em 1João trata-se apenas do amor intra-comunidade joanina. A ênfase é tão forte que Brown acredita que a comunidade joanina não tinha a responsabilidade de demonstrar amor cristão com outras comunidades cristãs. Da perspectiva do comitê autoral de 1João, o mandamento do amor mútuo é manifesto de modo exclusivo e intra-comunitário. Digno de nota que ambos são exegetas de primeira classe, mas por adotarem diferentes abordagens para a questão histórica da carta e da exegese de conceitos usados pelo autor, ambos chegam a conclusões diametralmente opostas.

[5] Sobre essa passagem Raymond Brown afirma: “Já vimos que o autor dessa epístola é singularmente inapto na construção de sentenças claras, mas nesses versos ele nos apresenta seu pior caso. Muitos comentaristas gentilmente chamam a passagem de ponto crucial, menos caridosamente, Loisy, Evangile-Epîtres 559, o chama de ‘gibberish’ (un galimatias). No mínimo, oferece competição com o prólogo no prêmio em obscuridade gramatical.” (Raymond E. Brown, The Epistles of John: Translated, with Introduction, Notes, and Commentary, vol. 30, Anchor Yale Bible (New Haven; London: Yale University Press, 2008), 453). Antes que se pense que essa é a opinião de pessoas descompromissadas com o texto da epístola, observe o que diz John Stott: “Esta passagem é um locus vexatissimus (Law). O sentido geral da passagem é claro, mas é gramaticalmente confuso e, desde os primeiros momentos, os comentaristas tem dificuldade em interpretá-lo”. (John R. W. Stott, The Letters of John: An Introduction and Commentary, vol. 19, Tyndale New Testament Commentaries (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1988), 148.) De modo mais sutil, Tatcher afirma que o texto grego é difícil (Tom Thatcher, “1 John,” in The Expositor’s Bible Commentary: Hebrews–Revelation (Revised Edition), ed. Tremper Longman III and David E. Garland, vol. 13 (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2006), 466), Daniel Akin afirma que o texto contém dificuldades textuais, gramaticais e exegética (Daniel L. Akin, 1, 2, 3 John, vol. 38, The New American Commentary (Nashville: Broadman & Holman Publishers, 2001), 162.), Derickson entende esses versos como entre os mais difíceis versos a se decifrar em toda literatura joanina (Gary W. Derickson, First, Second, and Third John, ed. H. Wayne House, W. Hall Harris III, and Andrew W. Pitts, Evangelical Exegetical Commentary (Bellingham, WA: Lexham Press, 2012), 366) e por fim, Bob Utley afirma que existe muita confusão na tradução desse texto (Robert James Utley, The Beloved Disciple’s Memoirs and Letters: The Gospel of John, I, II, and III John, vol. Volume 4, Study Guide Commentary Series (Marshall, Texas: Bible Lessons International, 1999), 224).

[6] Dentre os muitos problemas textuais dessa passagem, dois chamam a atenção: (1) a variante do verbo principal da primeira sentença do verso 19: saberemos (γνωσόμεθα; 01 02 03 04 044 945 (1241) (1243) 1505 1735 1739 1751 2494 2495) ou sabemos (γινώσκομεν; 1319 1448 1573 1646 1874 2191 2374). A primeira variante é adota pela NA28 (UBS5) e a segunda pelo RP2005 (Texto Majoritário); (2) o verbo tranquilizar/persuadir: a variante adotada por ambas NA28 e RP2005 é πείσομεν (tranquilizaremos/persuadiremos), muito embora a tradição Bizantina seja dividida aqui: πεισωμεν(que tranquilizemos/persuadamos) é uma leitura bom conhecida entre os mss Bizantinos (044 35 218 945 1241 1243 1646 1739 1874 2374). Infelizmente aa edição de RP2005 sequer menciona a existência de uma possível leitura distinta entre os mss Bizantinos.

Os principais dilemas gramaticais, léxicos e sintáticos dessa passagem são: (1) Nisto conheceremos (ἐν τούτῳ; v. 19) é uma referência ao que foi dito no verso anterior, ou ao que será dito na sequencia do verso? João nem sempre é claro como a referência que faz com essa expressão, e nessa epístola, essa mesma expressão é usada em referência ao que já foi dito, e em outras ocasiões ao que será dito. Daí a dificuldade em se precisar o referente nesse caso em particular; (2) Persuadir ou tranquilizar (πείσομεν), qual é o sentido do termo e como ele se relaciona com o contexto? (3) Nosso coração (ἡμῶν ἡ καρδία) é uma referência a que: (a) consciência; (b) emoções ou (c) intelecto? Qualquer uma dessas opções poderia ser justificada pela teologia bíblica, mas contratualmente é extremamente difícil escolher entre qualquer uma dessas opções. Entretanto, a decisão aqui não pode ser tomada aquém do contexto, pois se πείσομεν é entendido como tranquilizar, καρδία poderia ser uma referência à emoções; por outro lado, caso πείσομεν seja entendido como persuasão, καρδία seria melhor entendido como uma referência à consciência. A decisão aqui não é simples; (4) Talvez o mais delicado dos problemas exegéticos nesse texto é o repetido uso de ὅτι (cf.v.19; v.20a; v. 20b). Diante da complexidade de se entender o uso de cada uma das conjunções, algumas versões ignoram algum uso ou atribuem sentidos distintos para cada um deles. Mais comumente, comentaristas e tradutores tomam o primeiro como um ὅτι declarativo expressão o conteúdo do conhecimento, e o segundo ou de modo epexegético (expandindo e explicando a sentença anterior), ou como causal (explicação a razão da sentença anterior). A segunda opção acontece em outros lugares na carta, mas aqui causaria certa dificuldade com o terceiro uso de ὅτι, que eventualmente é ignorado na tradução e subentendido de modo epexegético ao segundo, seja ele causal ou epexegético. E mais uma vez, o sentido de πείσομεν é fundamental para se entender o uso dessas conjunções.

Em outras palavras, nesse pequeno verso das escrituras, fica evidente que detalhes fazem muita diferença para a interpretação e a atenção aos mesmos fundamental para o correto entendimento do texto. Uma leitura desatenta poderia dar ao leitor/pastor/professor uma sensação de certeza que a leitura mais aprofundada do texto não permitira. Por isso, é fundamental que diante da complexidade de um texto como esse, o leitor/pastor/professor mantivesse intocável a humildade. Esse não é um texto fácil de traduzir e/ou ensinar.

[7] A divisão de capítulos que vemos nas edições contemporâneas das nossas bíblias acredita-se ter sido promovida no décimo terceiro século pelo Bispo de Cantuária Stephen Langdon (1207-1228). Essa divisão de alguma forma foi absorvida por algumas versões latinas medievais, e afetou alguns poucos manuscritos gregos tardios. Entretanto, em função da influência da Vulgata na tradição cristã, tal divisão de capítulos sobrevive até os dias de hoje em nossas edições contemporâneas.

[8] A versificação dos capítulos do NT foi inicialmente promovida por Robert Estienne (Stephanus) na sua edição do conhecido Textus Receptusem 1551, e desde então tem sido replicada nas edições do texto grego e edições modernas. Reza a lenda que Stephanus teria feito a versificação do NT testamento durante suas muitas viagens a cavalo, e que os versos teriam sido assinalados a medida que o cavalo tropeçava na estrada (!). Evidentemente, tal estória não passa de uma lenda, mas explicaria como a versificação no nosso NT é em alguns lugares tão precárias. Bruce Metzger, explica que tal mito tenha sido originado na interpretação equivocada da sentença latina inter equitandum (enquanto cavalgava), que ao invés de indicar que ele estava cavalgando, contextualmente a expressão significava que Stephanus teria realizado a versificação do NT entre as pausas de suas viagens, mas não durante o processo da viagem (cf. Bruce M. Metzger, Manuscripts of the Greek Bible: An Introduction to Greek Palaeography (New York: Oxford University Press, 1981), 1). Caspar René Gregory, oferecendo a mesma interpretação do texto latino, por outro lado, afirma que Stephanus estava muito provavelmente deveras cansado de suas viagens e teria feito seu trabalho meio-dormindo, o que também explicaria o resultado desastroso de alguns casos de versificação (The Canon and Text of the New Testament).

[9] Na tradição manuscrita do NT é possível encontra elementos paratextuais como a κεφάλαια (kefálaia) e τιτλόι (titlói). A κεφαλάιαé a versão antiga das divisões de capítulo conhecida nas nossas edições modernas. A origem e a data de tal prática são desconhecidas, os primeiros códices que os contém são o Alexandrino e o Epfraemi ambos do quinto século. A κεφάλαια continha marcações de divisão do texto em especial no texto dos evangelhos para demarcar perícopes e histórias apresentadas no texto. Digno de nota é que tal demarcação era realizada por livro, sendo então reiniciada a medida que o escriba passava para outro livro durante o processo de produção do manuscrito. Atualmente, é possível acessar essas antigas divisões nas versões impressas da NA que os adiciona numerados na margem interna do texto (cf. NA27, p.78*-79*; NA28, 85*). Os τιτλόι (títulos) são pequenos resumos das divisões apresentadas para cada uma das κεφαλάια e normalmente encontram-se no início dos evangelhos. Digno de nota foi o impressionate trabalho de Eusébio de Cesaréia em criar um genial dispositivo de análise de perícopes dos evangelhos, conhecido como os Canons de Eusébio. Eusébio não apenas dividiu o texto, mas criou um sistema de referência cruzada para se estudar as diferentes histórias de modo paralelo. Nas edições impressas da NA os editores transcrevem os canons de Eusébio em grego antes dos evangelhos, com explicações em latim, alemão e inglês para as divisões (cf. NA27, pp. 84*-89*; NA28, pp. 89*-94*).

 

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