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Dez dias após a ascensão de Cristo, todos os discípulos se reuniram em Jerusalém. Sem aviso, algo como um vento impetuoso encheu toda a casa. “Línguas como que de fogo” (At 2.3) surgiram, e uma pousou sobre cada um deles.

O dia de Pentecostes. O Espírito de Deus chegou em sua plenitude.

Vento e fogo. Nuvem e chama. A presença de glória, que havia ido à frente e à retaguarda durante o Êxodo, que havia repousado sobre o tabernáculo (Nm 9.18), que havia enchido o templo (1Rs 8.10–11), agora repousa e preenche a nova morada de Deus – seu povo, ainda que manchados pelo pecado.

A tempestade da presença de Deus é impetuosa, mas não destrói. O fogo da presença de Deus pousa, mas não consome. Como pode ser isto? Jesus na cruz, foi destruído e consumido pela santa presença de Deus, para que Deus pudesse estar presente — pudesse fixar residência — no templo do seu povo, pela graça.

Neste momento misterioso, o Espírito Santo encheu os discípulos e milagrosamente os capacitou a falar em outras línguas. Jesus havia prometido enviar o Espírito para habilitar o testemunho de sua igreja no mundo (At 1.8), e no dia de Pentecostes, o Senhor assunto ao céu, manteve sua palavra.

Onde poderia este momento estranho se encaixar na história da redenção? Como ligaria isto o velho e novo testamentos? Como devemos compreender isto? Devemos começar pela audiência presente naquele dia.

A Reversão da Torre de Babel

Judeus piedosos de “todas as nações debaixo do céu” (At 2.5) estavam em Jerusalém, e eles se achegaram para ver a comoção. Para seu espanto, esses estrangeiros ouviram os discípulos pregando sobre as obras poderosas de Deus em Jesus, nas suas línguas maternas.

Na torre de Babel, Deus julgou e reprimiu a rebelião através da confusão de idiomas e dividindo o povo (Gn 11.1–9).

No dia de Pentecostes, Deus perdoa a rebelião, usando várias línguas do mundo para reunir o povo em Jesus. Os efeitos do pecado estão sendo desfeitos à medida em que o Espírito avança com o evangelho da graça de Deus em Cristo.

O dia de Pentecostes é uma reversão da torre de Babel.

No entanto, isto é muito mais do que a reversão da torre de Babel. É a restauração do Reino. Quando o Antigo Testamento pressagia a renovação do reino de Deus, antecipava o dia em que Deus curaria o povo dividido de Israel e unificaria seu reino sob o Rei Messias, da linhagem de Davi (Ez 37.15-28). O cumprimento das esperanças mais extravagantes de Israel estava começando de uma maneira inesperada, visto que judeus dispersos por todo o mundo estavam se unindo através da fé, sob o reinado de Cristo. Logo mais, esta restauração também se estenderá aos gentios.

O Primeiro Dos Últimos Dias

Essa aglomeração multinacional, perplexo com estes eventos estranhos, faz justamente a pergunta certa: o que isto significa? Os escarnecedores sugerem que os discípulos teriam invadido uma adega um pouco antes, mas Pedro — o mesmo que pouco antes teve medo até mesmo de confessar a Cristo — levanta a voz para responder.

Pedro toma as Escrituras, na qual seus ouvintes já criam, e mostra como elas apontam para Jesus, como sendo o “sim” para todas as promessas de Deus. No processo, ele nos dá um vislumbre maravilhoso de como os apóstolos — receptores de uma lição pós-ressurreição do próprio Jesus sobre interpretação bíblica (Lc 24.44; At 1.3) — compreendiam o Antigo Testamento, como tendo seu significado máximo e final em Cristo.

Pedro começa por Joel 2.28–32, onde o profeta ansiava pelos últimos dias em que Deus concederia as bênçãos da nova aliança e derramaria o seu Espírito sobre todo o seu povo. O Espírito não iria apenas habitar em líderes especiais e ungidos. Ele estará e habitará nos jovens e idosos, homens e mulheres, escravos e livres — todos os membros da comunidade da aliança.

Os últimos dias que Joel antecipava haviam chegado, e o Espírito pelo qual o profeta ansiava foi concedido. O Deus que havia habitado no Éden, no templo, e em Cristo, agora habitaria dentro de seu povo através do seu Espírito. Os “prodígios em cima, no céu e sinais em baixo na terra” (At 2.19, citando Jl 2.30) sinalizaram a chegada do dia do Senhor, a intervenção de Deus na história para julgamento e salvação.

Curiosamente, estes prodígios e sinais correspondem com muitas das descrições que cercam a morte e ressurreição de Jesus (Mt 27.45-54; 28.2). Por quê? Porque o dia do Senhor invadiu a história quando Deus julgou o pecado e operou a salvação para o seu povo na cruz. E agora, nestes últimos dias, todo aquele que invocar o nome de Cristo pela fé será abençoado com o Espírito e reconciliado com Deus.

A Oração de Davi, O Herdeiro de Davi

Pedro continua com uma pregação clara do evangelho: Jesus de Nazaré foi crucificado e morto por homens de acordo com o plano soberano de Deus, e ressuscitou dos mortos porque a morte não podia retê-lo. A morte — parte da maldição de Deus sobre o pecado — só pode ter pretensões legítimas sobre os pecadores. Mas Deus quebrou as correntes da morte que envolviam seu Filho, porque Jesus foi perfeitamente santo e impecavelmente justo.

Citando o Salmo 16.8–11, Pedro faz a afirmação desconcertante de que o próprio Davi, o maior rei de Israel, antecipou a ressurreição de Cristo. No salmo, Davi expressou sua esperança de que Deus não o abandonaria na morte, mas Pedro sugere que esta esperança se cumpre somente em Jesus. As palavras de Davi apontavam para o eterno filho, que Deus havia prometido, que herdaria seu trono para sempre.

Embora o Rei Davi houvesse morrido, o Rei Jesus — o verdadeiro Santo — subjugou a corrupção da morte no mais pleno sentido imaginável. A oração de Davi — “não deixarás a minha alma na morte” — é respondida no herdeiro de Davi, o Cristo, que não foi abandonado na sepultura, e no qual Davi e todos os que creem nas promessas de Deus, recebem a bênção da vida indestrutível.

Qual é o Significado do Dia de Pentecostes?

Esse Jesus, testificou Pedro, foi exaltado por sua ascensão à destra de Deus Pai — o lugar simbólico de poder e autoridade absolutos — e enviou o Espírito Santo prometido, cuja obra, a audiência judaica havia testemunhado com seus próprios olhos e ouvidos.

Então, qual é o significado dos eventos do dia de Pentecostes?

Pedro utilizou as Escrituras nas quais eles já criam, para interpretar os fenômenos que eles haviam acabado de testemunhar. Jesus havia realmente ressuscitado dos mortos e havia derramado seu Espírito para encher o povo da nova aliança de Deus, de acordo com as Escrituras:

Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que a este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo. (At 2.36).

O dia de Pentecostes é uma confirmação da história da redenção, de que Cristo ressuscitou e está reinando.

Através da pregação de Pedro, o Espírito Santo realizou seu trabalho de dar vida e penetrar o coração das pessoas. Se o que Pedro declara é incontestavelmente verdade, o que eles devem fazer? Necessitam se arrepender — concordando com Deus sobre a pecaminosidade de seus pecados e olhando com fé para Jesus — e entrar para a igreja, através do sinal e selo da aliança, o batismo. À medida que os rebeldes se arrependem e pela fé são batizados, eles são identificados como cidadãos da comunidade da nova aliança de Deus, e recebem todas as bênçãos que Deus prometeu, incluindo o perdão e o dom da habitação do Espírito.

A garantia de Pedro de que esta promessa do evangelho diz respeito “para vós outros e para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor, nosso Deus, chamar”, ressoam com eco da aliança abraâmica (Gn 12.1–3; 17.1–8), porque a bênção de Deus para as famílias e as nações se encontra no filho maior de Abraão.

Em um único dia, a igreja cresceu de 120 para 3.000 pessoas. E embora a descida do Espírito no dia de Pentecostes tenha sido um evento singular, o mesmo Espírito que descendeu em Jerusalém ainda reside dentro de todo o povo de Deus, e as mesmas promessas que Pedro anunciou, ainda são a esperança segura, reconfortante, e habilitadora de cada pecador que o Espírito traz para a fé em Cristo.

No Antigo Testamento, a festa de Pentecostes celebrava a fidelidade de Deus ao conceder a colheita. E o envio do Espírito no dia de Pentecostes significa que a colheita dos discípulos está apenas começando.

O que isto significa para nós? Significa que o Espírito de Deus derramado no dia de Pentecostes, tomará nossa proclamação da Palavra de Deus e a usará para edificar a igreja — exatamente como Jesus prometeu.

Traduzido por Tiago Hirayama.

Nota dos editores: Este artigo é uma adaptação do livro de Trevor Laurence, “The Story of the Word: Meditations on the Narrative of Scripture” [A História da Palavra: Meditações Sobre a Narrativa das Escrituras] (Wipf and Stock, 2017).

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