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Homens e Mulheres Não São Iguais

No livro Sex Scandal: The Drive to Abolish Male and Female [“Escândalo Sexual: O Ímpeto para Abolir Homem e Mulher”, em tradução livre – ainda sem edição brasileira], a jornalista Ashley McGuire articula a crise da identidade sexual que o Ocidente contemporâneo enfrenta, em um estilo incisivo e acessível.

McGuire examina várias frentes do atual ataque à realidade das diferenças sexuais: brinquedos e educação infantil, discurso cultural sobre os termos “sexo” e “gênero”, as faculdades e sua cultura sexual, as forças armadas, serviços de emergência, a indústria do entretenimento, desenvolvimentos legais, normas sociais e o movimento de identidade de gênero. Cada frente é apresentada por uma litania de relatos jornalísticos e casos célebres indicativos. Juntos, eles revelam uma sociedade repleta de conflitos sobre uma das realidades humanas mais básicas – a diferença entre os homens e as mulheres.

Em toda a sua análise, McGuire se posiciona contra a cegueira da sociedade em relação à realidade das diferenças significativas e inevitáveis entre os homens e as mulheres. É claro que a natureza não se prestará facilmente a ser uma dócil serva de nossas fantasias ideológicas. McGuire apresenta repetidos casos em que a mentira de que não há diferenças significativas entre os sexos é exposta constrangedoramente. Uma ordem natural não-submissa se reafirma, apesar de todas as nossas tentativas de resistir a ela. Infelizmente, seguindo determinadamente na trilha da ideologia, as rejeições da natureza são contrapostas por esforços redobrados para apagar as diferenças sexuais, isto acompanhado por recriminações que culpam uma sociedade não iluminada pela falha (natural) em se dar conta desta visão.

A Beleza das Diferenças

O medo ideológico das diferenças sexuais, no entanto, não tem fundamento: se acolhermos e cuidarmos das diferenças entre os sexos, nossas respectivas dignidades seriam aumentadas e não diminuídas. Para vivermos como iguais, sustenta McGuire, devemos redescobrir e apreciar nossas diferenças, não mais “com medo de nós mesmos” como pessoas sexuadas:

O sexo não necessita ser uma linha de frente de uma batalha ou uma fonte de escândalo nacional. As diferenças entre os dois sexos devem ser o ponto de partida para uma igualdade mais autêntica. Isto não significa um retorno aos tempos em que as mulheres não tinham acesso a bens básicos tal como a educação ou o voto. Aqueles tempos sofreram sob um equívoco igualmente problemático sobre as diferenças entre os sexos, onde se negava áreas em que os sexos são verdadeiramente iguais, ou seja, em sua capacidade intelectual e suas contribuições para a vida cívica. Mas é também uma afronta à igualdade dizer que homens e mulheres são idênticos e negar que uma sociedade civilizada requer certas correções para acomodar as necessidades singulares do sexo feminino.

McGuire nos oferece vislumbres de uma visão mais positiva, na qual nossas diferenças podem ser celebradas como dons distintos, na qual homens e mulheres não são competidores, mas sim companheiros e colaboradores, admirando e respeitando os pontos fortes únicos um do outro. Ela lamenta o fim do cavalheirismo, por exemplo, lembrando a seus leitores que “são as diferenças sexuais que ativam o cavalheirismo, e as mulheres são suas principais beneficiárias”.

As Mulheres nos Seus Próprios Termos

O interesse de McGuire é principalmente focado nos efeitos prejudiciais que a negação das diferenças sexuais tem sobre as mulheres. Ela argumenta que uma sociedade neutralizada em relação ao gênero diminui a felicidade e o bem-estar das mulheres, alienando-as de seus próprios corpos e individualidade, a fim de que elas possam funcionar mais efetivamente em papéis masculinos.

Por exemplo, a “sensibilidade emocional das mulheres com suas flutuações naturais” é embotada com o uso de produtos farmacêuticos, permitindo e encorajando “as mulheres a adotarem comportamentos que são tipicamente aprovados pelos homens”. Ao forçar as mulheres a se adaptarem às normas masculinas, isto as cegam para seus próprios pontos fortes específicos – pontos fortes dos quais tanto elas quanto a sociedade em geral podem se beneficiar enormemente. Sem querer abandonar a busca da igualdade, McGuire quer que a reformulemos, reconhecendo a igual dignidade e valor de homens e mulheres, cada um em seus próprios termos.

As raízes do nosso fracasso cultural em lidar com as diferenças sexuais de maneira responsável remontam à revolução sexual e à segunda onda do movimento feminista. McGuire destaca a famosa afirmação de Simone de Beauvoir: “Não se nasce, mas se torna uma mulher”, como um momento crucial no surgimento de uma abordagem ideológica disfuncional das diferenças sexuais.

Esta afirmação, ainda mais radicalizada no pensamento de teóricos subsequentes como Judith Butler, liberou expressões culturais de gênero da realidade natural das diferenças sexuais. Ao atribuir as muitas diferenças aparentes entre os sexos a papéis de gênero impostos pela cultura, o palco estava preparado para uma cruzada para erradicar todas as normas de gênero e a considerar a persistência das diferenças como prova de que a revolução simplesmente não tinha sido tão completa quanto necessita ser.

A Profundidade do Problema

O livro de McGuire não é nem um tratamento acadêmico nem teológico da questão das diferenças sexuais, e quem tiver a expectativa deste tipo de tratamento provavelmente ficará decepcionado.

“Sex Scandal” apresenta muitas das falhas características de relatos jornalísticos de fenômenos culturais. Casos de confusão motivada pela ideologia em relação às diferenças sexuais não são difíceis de obter, mas podem fornecer uma impressão distorcida da realidade da opinião pública. Como a própria McGuire reconhece: “Um cliente barulhento que leva o assunto para a mídia pode abafar 1 milhão de pessoas que estão ocupadas demais para politizar suas compras diárias”.

É importante reconhecer que tanto a reportagem proeminente de casos escandalosos quanto o poder dos extremistas para disseminarem suas normas, foram grandemente aumentados pela ascensão das mídias sociais, o que nos expõe a histórias que reforçam nossos preconceitos, aumentam a polarização do cenário político e diminuem o poder dos moderados. Para lidar com um panorama de informações tão complexo, seria de se esperar uma análise mais próxima e mais estratégica dos padrões sociais de disseminação ideológica, dos mecanismos pelos quais a ideologia do gênero ganha terreno e dos fatores materiais que tornam nossa sociedade propícia para sua ascensão.

Embora McGuire ocasionalmente revele profundas dimensões morais das questões das diferenças sexuais, ela não as explora. Suspeito que suas próprias convicções religiosas não poderiam ser prontamente expostas em um livro destinado a uma audiência geral. Sem o horizonte mais expansivo que a fé cristã oferece (e por sinal, até mesmo o pensamento filosófico mais desenvolvido), as diferenças sexuais não alcançam sua real relevância.

A magnitude das mudanças imaginativas e culturais exigidas para refletirmos adequadamente sobre gênero torna difícil para qualquer livro projetado para ser palatável a um público mais amplo lidar com muitas das nossas disfunções sociais mais fundamentais. Tentativas de desalojar as ortodoxias do individualismo autônomo, por exemplo, encontrariam resistência feroz em muitas frentes.

“Sex Scandal” é frequentemente um livro muito deprimente por causa de seu tópico, mas a análise de McGuire frequentemente fornece um contraponto refrescante e positivo às tendências sociais destrutivas que ela descreve. O livro não é um livro explicitamente cristão e, além de algumas referências a declarações papais sobre questões de gênero, revela pouco das próprias convicções católicas romanas da autora. No entanto, qualquer leitor cristão encontrará muita coisas com as quais anuir.

Traduzido por Felipe Barnabé

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