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Eu Me Sinto Invisível Após a Morte da Minha Esposa

No mês passado, perdi minha esposa após uma luta de sete anos e meio contra o câncer. Eu sou um pastor de 38 anos, e pai de três garotos incríveis de 12, 10 e 7 anos. Estou aprendendo que o luto é uma fera que está à espreita, imprevisível, que surge quando menos se espera, e nos lugares mais incomuns — na Disney World, no banheiro de uma loja, no Starbucks. Nenhum lugar é seguro na iminência de um ataque.

Estou descobrindo também que sou um processador verbal. Penso melhor quando falo, ou com uma caneta literal na mão, ainda mais ao estar desvendando essa tragédia.

Muitos têm perguntado: “Como é perder a sua esposa?” Tenho certeza de que é diferente para todos, assim como o é a dor do luto, mas aqui está uma tentativa recente, do meu diário, de domar o caos em meio à tempestade.

Perdendo a Quem me Via

“Como é perder sua esposa?”. Várias palavras vêm à mente. Uma delas é “invisível”. Eu me sinto invisível, à vista de todos. Não fisicamente invisível; eu sou um cara grande, por isso é difícil não me notar, e muitos têm abençoado a mim e aos meus meninos com cuidados e atenção. Portanto, não estou dizendo que não me sinto cuidado; na realidade, sinto-me indigno e humilde pela bondade que tenho recebido das pessoas.

Quero dizer “invisível” quase no sentido de quando uma garota olha para um cara em um filme e diz: “você vê através de mim!”. Ela quer dizer que há uma pessoa neste mundo que a compreende, que a entende com uma profundidade de intimidade que ninguém mais consegue. Claro, nos filmes eles costumam dizer isso depois de se conhecerem por cinco minutos. Mas depois de 14 anos com Cari, senti que ela me via — tudo de mim — e me amava mesmo assim. O belo. O mau. O feio. Ela via minhas imperfeições e me desafiava a crescer.

Nos primeiros anos do nosso casamento, eu via a sesta de domingo como um ato de adoração; Cari via isto como pecado, já que interferia com o tempo da família juntos. Brigamos por causa disso, mas ela, pacientemente, me amava mesmo assim. Eu considerava isto irritante, até que lhe perguntei por que isso era tão importante para ela. Ela disse: “Josh, você não vê que um dos nossos maiores problemas é que eu só quero mais de você?” Isso me deixou quieto muito rapidamente. Como compreender isto? Uma mulher que o observa por muitos anos ainda quer mais. Meu primeiro pensamento foi: por quê? Pensei em duas razões: (a) ela é louca; ou (b) a graça de Deus. Talvez um pouco de cada uma.

Cari via evidências da graça em minha vida e me contava sobre elas de uma forma que me fazia enrubescer. Ela sabia que poderia me prostrar com apenas uma palavra, e às vezes ela o fazia. Ela sabia quais eram meus medos. Conhecia os meus sonhos. Sonhávamos juntos o tempo todo. Eu me abri totalmente para ela. Confiei tudo a ela. Somente a ela.

E ela confiava em mim. Ela confiou a mim os segredos de seu coração, com suas esperanças e medos. Cari me permitiu testemunhar o processo de seu pensar, em todos os tipos de questões. Eu a via, e ela me via, de uma maneira que ninguém mais o fez.

E agora, a única pessoa que me via se foi. A única que podia ler cada olhar meu e antecipar minha resposta não está mais disponível. Não há como substituir 14 anos sendo visto por alguém à cada dia e noite. Não se pode substituir uma alma que firmou uma aliança para ficar com você, não importa o que acontecesse. Sinto falta do calor e da segurança disso — da beleza inigualável disso. Portanto, há um sentido real em que uma sala lotada me faz sentir mais invisível porque ela não está lá — aquela a quem que eu sempre buscava na multidão, a pessoa que me via e estava lá para mim, não importa o que acontecesse.

Ser tão visto e amado desta maneira é o mais próximo que qualquer um de nós chegará de vivenciar o amor de Deus por nós em Cristo. Cristo me conhecia quando eu ainda estava no ventre de minha mãe. Nenhum dos meus dias lhe foi oculto (Sl 139). Nenhum pecado jamais escapou de Sua atenção. No entanto, tenho uma promessa: nada pode me separar do amor de Cristo (Rm 8.28-39). Estas são boas novas e são reais. Mas a dor também é real. É profunda e farpada. Se a agonia pela separação de Cari é apenas uma pequena imagem da tragédia maior da separação de Deus, então que Deus nos salve a todos, e somente em Cristo. Maranata.

Escrevi isto há um mês, alguns dias depois da morte de Cari. Continuo a tratar, continuo a sofrer, continuo a aprender. Aqui estão duas lições simples que Deus está me ensinando.

1. Ele Me Vê

Primeiro, a perda de ser visto por Cari me lembra que, de uma maneira muito mais profunda, Cristo me vê. Eu sei que Jesus não é minha namorada, mas ele é o amado da minha alma. Seu olhar como de laser nunca se retira. Sua atenção nunca diminui. Ele nunca me abandona, não importa quão feio eu esteja. Ele morreu para me tirar da nojeira da minha rebelião para com ele mesmo.

E ele, tal como Cari, quer mais de mim. Isto é o suficiente para, às vezes, deixar de fazer a sesta

2. Seu Povo Me Vê

Em segundo lugar, percebi que necessito ser mais transparente com os outros, especialmente com alguns irmãos que me amam. Necessito compartilhar as partes de mim sobre as quais me envergonho. Necessito dar-lhes abertura para que falem à minha vida. E neste processo, sinto que minha sanidade está voltando e me fundamentando.

Aqui está a realidade surpreendente. Tenho medo de ser visto, de ser vulnerável, de ser honesto. Temo que os outros pensem mal de mim. E, no entanto, a maior dádiva em tudo isto foi a experiência de precisar desesperadamente de ser visto, depois ser visto e acolhido pelo corpo de Cristo. É revigorante ser visto em meu estado danificado e mesmo assim ser abraçado, e não rejeitado, pelo corpo de Cristo. Isto tem servido como um bálsamo de cura para a sensação de invisibilidade, que só pode levar ao desalento.

Traduzido por Joāo Pedro Cavani

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