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No mês passado, um grupo de teólogos protestantes se encontrou na Califórnia para dialogar sobre o futuro do protestantismo. Os resumos deste evento, bem como os itens que requerem follow-up, podem ser encontrados em outros lugares. No entanto, a preocupação a respeito de uma unidade cristã visível, levanta muitas questões sobre a importância de divergências doutrinárias, litúrgicas e práticas. Tais questões normalmente orbitam em torno de quais doutrinas consideramos como “essenciais” ou “necessárias”. No entanto, há anos que me sinto insatisfeito com este tipo de análise superficial, pois ela não lida com a complexidade das divisões dentro do corpo.

Efésios 4 nos diz que a unidade cristã é algo que devemos guardar (4.3) e algo que devemos buscar (4.13). É ao mesmo tempo, um pressuposto e um objetivo, algo que possuímos e devemos proteger, e algo que nos falta e que devemos buscar. A unidade que devemos buscar está intimamente ligada à maturidade, à “medida da estatura da plenitude de Cristo”. O texto também nos diz que um dos sinais de imaturidade é ser levado ao redor pelos ventos de doutrina. Portanto, gostaria de sugerir que parte do crescer em maturidade como indivíduos, como congregações, como instituições, e, se Deus quiser, como uma igreja universal, é a capacidade de fazermos distinções quando se trata de discordâncias doutrinárias. Todas as verdades são importantes, mas nem todas as verdades são igualmente importantes. Algumas são “de primeira importância” (1 Co. 15.3–4). Há temas na lei que são mais importantes do que outros (Mt. 23.23). E, portanto, devemos crescer em nossa habilidade de ponderar adequadamente doutrinas e práticas, a fim de preservarmos e buscarmos nossa unidade em Cristo. O que segue abaixo é uma tentativa de introduzir os tipos de distinções que devemos tentar identificar ao avaliarmos nossas divisões.

Devemos ser capazes de distinguir entre diferentes tipos de doutrinas essenciais. Estas distinções se centram no peso relativo da própria doutrina.

  1. Essencial para a vida da igreja. Estas doutrinas são necessárias para a salvação; sem elas, não há igreja verdadeira.
  2. Essencial para a saúde da igreja. Estas são necessárias para o crescimento cristão; entendê-las equivocadamente não tira as pessoas do reino, mas pode torná-las doentes e incapazes de florescer. Esta categoria é melhor compreendida como um espectro; quanto mais perto se está da categoria 1, mais doente se fica.
  3. Essencial para a prática da igreja. Estas doutrinas são necessárias para a unidade funcional. Embora possamos não considerar doentes ou não saudáveis os cristãos que divergem de nós, as considerações práticas necessárias para que nos relacionemos bem, podem revelar-se demasiadamente onerosas.
  4. Doutrinas não essenciais ou adiáforas (coisas que são indiferentes). Estas doutrinas nunca devem dividir os cristãos, o que significa que aqueles que diferem poderiam ser membros e até mesmo anciãos em uma mesma igreja sem qualquer divisão.

No entanto, completar a tarefa de distinguir entre a importância relativa da própria doutrina, não é o fim deste processo. Temos então de avaliar a pessoa que defende esta doutrina, para discernirmos como ele se posiciona em relação à ela e por que. Quais são então, as diferentes posturas?

  1. Uma pessoa pode afirmar que a doutrina é verdadeira.
  2. Uma pessoa pode deixar de afirmar a doutrina, porque nunca ouviu falar sobre ela.
  3. Uma pessoa pode negar a doutrina por ignorância ou mal-entendido.
  4. Uma pessoa pode negar a doutrina tendo um conhecimento verdadeiro e preciso sobre ela.

Deixar de afirmar não é o mesmo que uma negação ativa, e uma negação a partir de um mal-entendido não é o mesmo que negar mesmo quando se tem um entendimento correto sobre a doutrina. Tais considerações devem afetar a forma como tratamos a pessoa em questão.

Mas, mesmo após determinamos o peso relativo da doutrina e onde a pessoa ou igreja se encontra em relação à ela, ainda temos trabalho a fazer. Devemos fazer distinções entre

  1. Igrejas e indivíduos
  2. Líderes e fiéis
  3. Ovelhas confusas e lobos devoradores

Devemos também avaliar:

  1. A maneira como a pessoa sustenta uma doutrina. Ela faz uma tempestade em um copo d’água? Ou de tempestades ela consegue extrair copos d’água?
  2. A maneira com que as doutrinas se conectam. Embora realmente haja a falácia da ladeira escorregadia, algumas vezes as ladeiras ficam realmente escorregadias.
  3. A possibilidade de inconsistência doutrinária. Regularmente me deparo com crentes cujos corações são mais inteligentes do que suas cabeças.

Além disso, necessitamos ter alguma consciência histórica, uma noção sobre como a igreja como um todo se posicionou a respeito de várias questões ao longo da história. Devemos prestar atenção nas causas históricas de divisões entre os cristãos (por exemplo, a história do racismo nos Estados Unidos certamente afetou divisões doutrinárias, embora o motivo da divisão não tenha sido a doutrina). Devemos desenvolver a capacidade de ler a história em que estamos inseridos, para identificarmos trajetórias, termos uma consciência da atual situação cultural para a igreja, e estarmos conscientes da direção para onde os ventos de doutrina estão soprando. Finalmente, devemos reconhecer nosso próprio local e as batalhas particulares que Deus está nos chamando a lutar (ou as cercas que ele está nos chamando a reparar).

Agora esta proposta parece complicada. E este é o ponto. A verdadeira unidade demanda que cresçamos em nosso pensamento sobre a doutrina, a verdade e a comunhão. Ela exige maturidade cristã, do tipo que pode falar a verdade em amor, para que juntos possamos todos crescer “em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual o corpo inteiro, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor.” (Ef 4.15-16).

Nota dos editores: Estes comentários, juntamente com uma exposição mais completa deste texto de Efésios 4, são extraídos desta mensagem apresentada no Bethlehem College and Seminary.

Traduzido por Bruno Nunes.

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