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Como Encontrar Voz Própria na Pregação

Parece que algumas pessoas simplesmente nascem com “o dom”. Possuem a capacidade e o carisma inatos para comunicarem uma mensagem com precisão e paixão.

No passado, cheguei a pensar que tinha “o dom” também. Lembro-me vivamente do sentimento de quando era estudante de ginásio e apresentei um caso perante um júri simulado. Desde as palavras de abertura até o final, a classe parecia estar arrebatada. Algumas pessoas me disseram que eu tinha “o dom” quando preguei na semana anual de sermão pelos jovens na minha igreja. Sabe aquela semana do ano, quando o pastor dá oportunidade a um novato, após oito meses de preparo, para pregar sobre 1 Timóteo 4.12? É melhor ter “o dom” quando lhe derem esta tarefa.

Essas ilusões me acompanharam ao ministério pastoral. Embora soubesse que havia muito a aprender, estava certo de que o púlpito seria um lugar confortável e estável. Quando a verdade dolorosa ficou clara para mim; minha ingenuidade me levou a lugares sombrios.

Eu não tinha “o dom”.

Tornei-me um Imitador

Então, vejam o que fiz quando comecei a me dar conta disto: tentei moldar meu ministério de púlpito como o fazia uma pessoa que tinha “o dom”. Tornei-me uma caricatura de alguém que eu julgava ter teologia e pregação eficazes. Adotei seus modismos, sua cadência na fala e seus temas como se fossem meus próprios — repetindo como um papagaio aos meus ouvintes sob o disfarce de uma exposição envolvente. Mas não o era, pelo menos para mim. Não há dúvida que preguei muitas coisas verdadeiras e úteis sobre as Escrituras durante aqueles anos. Eu estava regurgitando um vocabulário teológico que era e é, transformador. No entanto, esta não era a voz do Espírito ou a intenção do autor através de mim.

Eu me pergunto se Timóteo também passou por minha situação. Talvez a sua timidez estivesse ligada à proclamação da Palavra. Sabemos que Paulo o exortou várias vezes a fazer exatamente isto (1 Tm 4.2). Lemos esta epístola e nos apressamos a aplicá-la aos leitores modernos. Nós também somos conclamados a pregar a Palavra. Muitas vezes, em nossa pressa para aplicar o texto, deixamos de notar a natureza pessoal da epístola em si. Paulo a escreveu a um jovem pastor — a um portador da imagem de Deus que o próprio Deus designou para liderar a igreja. “Pregue a Palavra!” Vozes sem um corpo não pregam. As pessoas reais o fazem — pessoas com personalidades, histórias, medos e convicções, que são tecidas de uma forma única por Deus tornando-os naquela pessoa que proclama: “Assim diz o Senhor”.

Identifiquei seis formas de promover o crescimento nesta fase do meu ministério — e de ajudar pregadores a encontrarem sua voz própria mais cedo.

1. Passe Tempo Junto com Mentores Honestos

Todos nós necessitamos de pessoas que estão dispostas a analisar e comentar nossas tentativas incipientes de proclamar a Palavra de Deus ao povo de Deus. O ideal é que isto ocorra em um contexto de uma igreja saudável, onde há muitas oportunidades para repetir regularmente esta atividade. É por isso que, nos primeiros anos como pregador, vale a pena fazer o que for necessário para estar ministrando em uma igreja saudável.

É necessário não só ganhar maior experiência de pregação, mas também ter pessoas dispostas a se encontrarem com você na segunda-feira e apontar os pontos fortes e fracos do seu sermão. Tais mentores podem caminhar com você ao longo de vários anos para acompanhar seu crescimento e asseverar a voz única que você leva ao púlpito.

2. Diversifique as Vozes que Consome

Consumir demasiado de uma única voz torna mais difícil evitar a armadilha da imitação. Seria tolice negar que o ministério de nossos heróis, seja ele escrito ou pregado, tem um efeito sobre nós. Devemos louvar a Deus pelo impacto que eles tiveram em nossa formação. No entanto, quando nossos sermões soam como uma versão de microondas dos de John Piper ou de Martin Lloyd-Jones, temos um problema.

Encontramos a profundidade na pregação quando nos fartamos no banquete da sabedoria de Deus, mediada por um grupo diversificado de vozes, com uma variedade de perspectivas e estilos. À medida em que ampliamos aquilo que lemos e ouvimos, começaremos a perceber que Deus pode falar, e de fato fala, através da singularidade de cada indivíduo, e não apenas de um personagem de pregação perfeito. Ao conversarmos com outras pessoas, veremos que Deus usa certas vozes para afetar ouvintes diferentes de formas diferentes. Isto nos fornecerá o incentivo necessário para encontrar a nossa voz própria.

3. Corra o Risco de Experimentar

São poucos os padrões de vida que desenvolvemos sem uma parcela considerável de fracasso e frustração. O mesmo se aplica à nossa pregação. Infelizmente, muitas vezes não nos concedemos a graça de malograr, de nos recuperarmos e de mudar. Tal processo, que não tem nada de cativante, é necessário a todos os esforços criativos, para que o resultado seja autêntico. É por isso que, no púlpito, devemos tentar modos variados de comunicação, não porque saibamos que eles funcionam (pelo menos não a princípio), mas porque estamos tentando determinar aquilo que soa bem em nossos lábios e o que comunica melhor aos ouvintes.

Isto poderá significar piadas sem impacto ou ilustrações pessoais que pareçam artificiais. No entanto, jamais saberemos o verdadeiro resultado até tentarmos, malograrmos e finalmente encontrarmos nosso estilo nas semanas e anos que estão por vir.

4. Faça Pausas Estratégicas

Os domingos se seguem com rapidez. Isto não dá muita margem para adaptar nosso estilo e encontrar nossa voz. Mesmo aqueles que pregam apenas um sermão por semana acham difícil sair do molde quando estão sob a pressão de ter alguma coisa pronta para o Dia do Senhor. Por esta razão, é aconselhável fazer pausas que lhe deem tempo para refletir e progredir. Além disso, submeter-se ao ensino de outra pessoa poderá fornecer insights úteis quanto ao seu próprio estilo de pregação.

5. Confie na Localização Estratégica de Deus

Em sua essência, a tentação de imitar revela uma falta de fé na localização estratégica de Deus de nossas vidas no meio de um grupo de pessoas, cada uma com necessidades individuais únicas. É claro que poderíamos simplesmente ler para eles um sermão de um grande pregador expositivo, e eles até poderiam ser abençoados. Mas isto eles podem fazer por si mesmos.

Nosso povo necessita que encarnemos a mensagem de Deus para o seu povo em um tempo e lugar específicos, com a precisão de um pastor cuidadoso que conheça bem suas ovelhas a ponto de conseguir comunicar a verdade às suas vidas diárias complexas. Quanto mais crescermos em confiança de que Deus designou a nós — e não a outro pregador mais imponente — para o nosso próprio contexto estratégico, mais fácil e rápido será encontrarmos nossa voz própria.

6. Siga em Frente

Acima de tudo necessitamos crer que a pregação eficaz requer perseverança. É fácil olhar com inveja para aqueles que cremos ter o famigerado “dom”, mas ao mesmo tempo ignorar as centenas de horas que eles provavelmente investiram aperfeiçoando e refinando sua voz. Isto não deve criar a ilusão de que todos nós seremos comunicadores excepcionais se investirmos tempo suficiente. Tal como eu, a maioria ficará sempre apenas um pouco acima da média.

Ao invés de deixar que isto nos esmague, esta é uma realidade que deve nos dar esperança, uma vez que o currículo de Deus está cheio de experiências de trabalho usando pessoas com capacidade mediana para realizar coisas incríveis. Nossa confiança está nEle e no poder de sua Palavra, e não em nosso desempenho ou nossa capacidade de copiar os dons de outros.

Deus já tem um John Piper, um Conrad Mbewe, um H.B. Charles, um Martyn Lloyd-Jones. Por razões que talvez só sejam conhecidas por Ele mesmo, o Senhor o chamou ao púlpito para que você seja você mesmo e para que se esqueça de si mesmo. Vá em frente e encontre sua voz.

Traduzido por David Bello

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